\ A VOZ PORTALEGRENSE: AA - Memória e Poder

segunda-feira, março 25, 2024

AA - Memória e Poder

Memória e Poder

Do Capitólio à Rocha Tarpeia, não vai mais do que um passo.

Na Roma antiga, a Rocha Tarpeia era um local onde eram feitas execuções, sendo as vítimas lançadas desta rocha para a morte. E a expressão que ainda hoje lembra esses dois lugares romanos, Rocha Tarpeia e Capitólio, é utilizada para lembrar como o Poder é efémero.

Que o diga Aníbal Cavaco Silva, dez anos primeiro-ministro, uma década presidente da República, que no passado 10 de Março viu na sua terra natal, Boliqueime, um partido à direita do PSD ficar confortavelmente à frente desse mesmo PSD nas eleições legislativas.

Longe vai o tempo em que o Cavaquistão parecia indestrutível. A arrogância, a soberba, o caciquismo que caracterizou esse período, a constante tentativa de asfixiar eleitoralmente o partido situado à sua direita, a par de uma estratégia económica Keynesiana de obras públicas financiadas pela União Europeia, deixou reais marcas.

Contudo, hoje Cavaco Silva é mais lembrado pela frase de que “nunca se enganava e raramente tinha dúvidas”, do que pela obra de betão que deixou como legado, ou pelo tempo que passou no Palácio de Belém.

Vindo como que de ‘além-túmulo’, Cavaco Silva protagoniza várias aparições públicas na campanha eleitoral do seu partido de sempre e escreve artigos na imprensa, no sentido de mostrar o seu apoio incondicional ao líder e ao projecto do PSD.

Mas, pelo menos em Boliqueime, não se pode dizer que o entusiástico apelo ao voto no PSD por Cavaco Silva tenha sido foi ouvido, pelo contrário.

Assim sendo, poder-se-á questionar se há uma ingratidão político-ideológica em relação a Aníbal Cavaco Silva, que conquistou maiorias absolutas e venceu eleições presidenciais.

É um facto que Cavaco Silva foi um vencedor na política portuguesa nesta Terceira República e é inquestionável que deixou obra pública.

Todavia, nunca deixou de mostrar uma faceta de autocrata, jamais mostrou sentimentos altruístas, não foi dialogante, mostrou-se sempre esfíngico e distante na forma como se relacionou com apoiantes e adversários. Também não teve apetência para a Cultura, quiçá, por força da sua formação técnica.

Agora nada diz ou representa para as gerações que hoje têm funções na política e para o actual eleitorado. Cavaco Silva é ‘uma voz do passado’ que veio ao presente e não foi ouvido.

Mário Casa Nova Martins