AA - Memória e Poder
Memória e Poder
Do Capitólio à Rocha Tarpeia, não vai mais do que um passo.
Na Roma antiga, a Rocha Tarpeia era um local onde
eram feitas execuções, sendo as vítimas lançadas desta rocha para a morte. E a
expressão que ainda hoje lembra esses dois lugares romanos, Rocha Tarpeia e
Capitólio, é utilizada para lembrar como o Poder é efémero.
Que o diga Aníbal Cavaco Silva, dez anos primeiro-ministro,
uma década presidente da República, que no passado 10 de Março viu na sua terra
natal, Boliqueime, um partido à direita do PSD ficar confortavelmente à frente
desse mesmo PSD nas eleições legislativas.
Longe vai o tempo em que o Cavaquistão parecia
indestrutível. A arrogância, a soberba, o caciquismo que caracterizou esse
período, a constante tentativa de asfixiar eleitoralmente o partido situado à
sua direita, a par de uma estratégia económica Keynesiana de obras públicas
financiadas pela União Europeia, deixou reais marcas.
Contudo, hoje Cavaco Silva é mais lembrado pela frase de que
“nunca se enganava e raramente tinha dúvidas”, do que pela obra de betão que
deixou como legado, ou pelo tempo que passou no Palácio de Belém.
Vindo como que de ‘além-túmulo’, Cavaco Silva protagoniza
várias aparições públicas na campanha eleitoral do seu partido de sempre e
escreve artigos na imprensa, no sentido de mostrar o seu apoio incondicional ao
líder e ao projecto do PSD.
Mas, pelo menos em Boliqueime, não se pode dizer que o
entusiástico apelo ao voto no PSD por Cavaco Silva tenha sido foi ouvido, pelo
contrário.
Assim sendo, poder-se-á questionar se há uma ingratidão
político-ideológica em relação a Aníbal Cavaco Silva, que conquistou maiorias
absolutas e venceu eleições presidenciais.
É um facto que Cavaco Silva foi um vencedor na política
portuguesa nesta Terceira República e é inquestionável que deixou obra pública.
Todavia, nunca deixou de mostrar uma faceta de autocrata,
jamais mostrou sentimentos altruístas, não foi dialogante, mostrou-se sempre
esfíngico e distante na forma como se relacionou com apoiantes e adversários.
Também não teve apetência para a Cultura, quiçá, por força da sua formação
técnica.
Agora nada diz ou representa para as gerações que hoje têm
funções na política e para o actual eleitorado. Cavaco Silva é ‘uma voz do
passado’ que veio ao presente e não foi ouvido.
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