Luís Filipe Meira
Teresa Salgueiro no CAE
Mistérios e Maravilhas
Teresa
Salgueiro, a voz dos Madredeus durante mais de 20 anos, veio a Portalegre ao
Grande Auditório do CAE apresentar o seu novíssimo disco, “ O Mistério”, nas lojas desde dia 8. A sala sem estar cheia apresentou-se
bem preenchida por um público de meia-idade, entusiasta quanto baste, que
deixava transparecer o conhecimento e admiração pela obra da artista.
Naturalmente
que este concerto gerava diversas expectativas, afinal a carreira de Teresa
Salgueiro sempre se confundiu com os Madredeus e ela própria reconheceu em
entrevista a este jornal, que o estranho é se essa colagem não existisse, não
renegando a experiência e assumindo que esse tempo faria sempre parte da sua
vida. E aqui nascia outro desafio, percebermos se apesar de assumir o passado,
a artista conseguia libertar-se desse fardo, positivo mas um fardo, e definir
um novo rumo para o futuro. As experiências anteriores fora dos Madredeus
tinham passado por diversas realidades musicais e segundo a cantora foram
sempre em parceria, enquanto “O Mistério”,
esse sim, está assumido como o primeiro disco a solo porque escreveu as letras,
compôs, produziu e o disco teve tempo de maturação suficiente para se tornar
naquilo que ela e os seus músicos, com os quais se identifica totalmente,
quiseram. Portanto como se percebe as expectativas eram imensas.
Expectativas
que foram razão suficiente para adquirir o disco e assim, ir para o concerto
totalmente identificado com esta nova etapa da carreira de Teresa Salgueiro. É
óbvio, que esta prática podia ser um risco, caso o disco fosse uma desilusão, o
que não aconteceu, mas fez-me temer que o concerto pudesse cair nalguma
monotonia, que senti a espaços durante a audição, o que me levou a ir para o
CAE com expectativas já mais moderadas.
Percebo
hoje que a audição intensiva e antecipada de “O Mistério” terá sido,
eventualmente, um erro, pois o concerto deu-me uma perspetiva que, certamente
por minha culpa, não tinha conseguido descobrir no disco, tendo-me proporcionado,
nomeadamente através das letras, uma forma diferente de abordagem a uma
realidade que eu julgava conhecer.
Chegados
aqui, pode o leitor inferir - se gosta de música e não esteve no CAE - que
perdeu um bom concerto de uma voz marcante da música portuguesa que, tudo leva
a crer, encontrou o rumo próprio para uma carreira a solo e julgo poder afirmar,
sem grande margem de erro, que não deverá ter grandes dificuldades em se impor
aqui e lá fora, por mérito próprio e não por viver na área de influência
Madredeus. Situação que não é virgem recorde-se que Rodrigo Leão também se
impôs depois de ter integrado e saído da primeira formação do grupo de Pedro
Aires de Magalhães, se bem que as variáveis não sejam exatamente as mesmas.
Rodrigo Leão foi pilar importante na estrutura mas nunca foi o rosto do grupo
como Teresa Salgueiro, daí ter sido mais fácil para ele livrar-se dessa
identidade, apesar da música que faz também não estar assim tão longe do universo
Madredeus.
“The
last but not the least” ou seja por último mas não o menos importante, uma palavra para os músicos que estão
com Teresa Salgueiro, que fez questão de salientar a reciprocidade na
identificação, assumindo que o projeto só arrancou porque sentiu que estes
quatro músicos eram as pessoas certas para o fazer. Salta à vista que há aqui
grande proximidade e cumplicidade entre todos, o que dá grande unidade ao
espetáculo. Ainda assim terei que dar enfase à imensa qualidade de Rui Lobato –
já vinha acompanhando a cantora no tempo dos Lusitânia Ensemble –
percussionista e baterista de primeira água e sabe-se quão difícil é trabalhar
percussões em música tão serena e tranquila como esta.
O
título deste texto,” Mistérios e
Maravilhas” foi uma chapelada a um velho disco dos Tantra, grupo de rock
sinfónico dos idos anos 70, liderado por Frodo, alter-ego de um visionário chamado
Manuel Cardoso. Este título ocorreu-me durante o concerto, já eu tinha pensado
em “Celebrar a vida” expressão que a
artista utilizou por diversas vezes. No entanto penso que “Mistérios
& Maravilhas” define perfeitamente o que se passou no CAE no dia 22. O
concerto levou-nos a celebrar a vida, celebrando a música, mas sempre envolto
numa aura de mistério associado à magia e à beleza da vida e da música numa
perspetiva luminosa e positiva, evitando as sombras, as
trevas e os malefícios deste mundo, como está consubstanciado neste estrato de “Ando
entre Portas” (…) Há-de haver uma saída/Um sinal de luz na minha
vida/Vou abrindo as portas/ Quero ver/ O horizonte que estão a esconder
(…)
O
concerto foi muito bom e estou convencido que me vai ajudar a abordar o disco
numa outra perspetiva, quiçá mais otimista. É também para isto que os concertos
de suporte à edição discográfica servem, para nos abrirem novos horizontes e
assim fruirmos na plenitude, as propostas que nos são apresentadas.
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