António Martinó de Azevedo Coutinho
Terminou
a época anual do pontapé na bola indígena. Um ano, excepto quanto ao FCP, para esquecer... Outros, mais
filosoficamente, dirão: para lembrar. São os pedagogos, que acham haver sempre
lições a reter. Pois, seria verdade, se alguém pudesse registar os resultados
dessa aprendizagem, o que não parece ser o caso, tal a regularidade com que as coisas vão acontecendo, sempre cada vez
mais iguais a si próprias. Digo coisas
para homenagear o senhor ministro da dita coisa
que instituiu e dignificou o vocábulo, onde passa a caber tudo sem nada lá
caber...
Porém,
este ano futebolístico terminou sob o signo da contestação ao nível dos
chamados “dois grandes” lisboetas e, vá lá, nacionais... As inscrições murais,
ainda que diversamente motivadas, revelaram o descontentamento latente. Pode
até afirmar-se que não representam o sentir de todos os sportinguistas e de
todos os benfiquistas, mas reflectem, certamente, o sentir de quem já está
farto de promessas não cumpridas, de objectivos jurados sem qualquer concretização.
Quando a vitória é o fim último visado pela competição, sobretudo no mundo do
futebol, então pode afirmar-se que, de derrota em derrota ou de empate em
empate, se chegou à frustração definitiva. Para o ano será melhor - transformou-se
esta frase na expectativa ou na ladaínha de cada época, pobre sinal de tempos
onde a desilusão do presente se acumula aos fatalismos de recentes passados com
reflexos no próprio futuro...
Todos
trauteamos a velha máxima dos vencidos e conformados, aquela que reza ser mais
importante competir do que vencer. Pois, mesmo sendo isto teoricamente verdade,
ganhar de vez em quando não é de todo incompatível com tal princípio,
provavelmente de origem olímpica, quase de certeza grega, o que não lhe confere
grande credibilidade nos tempos que passam...
Mas
o que poderemos reter do que agora entra em pausa, sem esquecer a próxima saga colectiva
dos nossos melhores (isso é outra história!), o que deve ficar como corolário
da coisa?
Basicamente,
que o Benfica foi capaz de perder um campeonato que esteve como nunca ao seu
alcance e que o Sporting passou uma lamentável época em que foi sucessivamente
desperdiçando todas as oportunidades com que sonhou. A amarga cereja no topo do
verde bolo foi a Taça de Portugal, que a briosa Académica amplamente mereceu.
Para
mim, tanto na Luz como em Alvalade aconteceram coisas bem mais graves do que estas públicas frustrações.
Mesmo
sem grandes aprofundamentos, basta pensar um pouco no facto de todos os 66
golos marcados pelo SLB terem
assinatura estrangeira. Repito: nenhum golo do Benfica foi marcado por um
português. Quando pensa nos Eusébios, nos Águas, nos Torres ou nos Nunos Gomes dos
anais da sua história clubista, entre resíduos de um sobrevivente orgulho, algum
adepto do “glorioso” pode encarar este fenómeno internacionalista com fundada esperança?
Escrevia
recentemente um analista destas coisas que apenas um jogador benfiquista
-Nélson Oliveira- foi agora seleccionado, porque a equipa encarnada parece ter
sido organizada para disputar muito mais a Taça dos Libertadores da América do
que a europeia Champions! De facto,
devia haver limites legais para esta “orgia” hispano-americana, sobretudo
quando protagonizada por um clube que até 1979 apenas inscrevera atletas
nacionais.
Isto
é o resultado duma política desportiva errada que persegue apenas os efeitos a
curto prazo, descurando os valores da sua própria e digna tradição... Afinal,
com os resultados à vista.
Pelo
lado do Sporting, não é mais brilhante o panorama. Pode dizer-se que quase
metade dos actuais seleccionados foi formada na Academia leonina, mas também se
perguntará quantos ainda moram em Alvalade e o porquê. Nem todos os golos da
época tiveram marca holandesa, é verdade, mas para lá caminhamos...
Porém,
como sportinguista, aquilo que neste momento mais me preocupa tem a ver com
recentes declarações do treinador Sá Pinto. Quando este acaba de censurar as
palavras dum jovem jogador da casa, emprestado à Académica, parece ter de
súbito negado todo um surpreendente percurso actual em que vinha revelando um
equilíbrio, uma competência e uma maturidade que poucos poderiam ter antecipado
em alguém dotado duma personalidade quase sempre dominada pela impetuosidade e
por uma certa irreflexão. Mas este estádio, infelizmente, pareceu ter
regressado em tão infeliz episódio.
Quando
Adrien Silva declarou que tudo iria fazer pela sua actual camisola, negra,
Sá
Pinto censurou-o asperamente, explanando com azeda ironia o seu “apreço” pelo
optimismo e pela vontade de ganhar assumidos por um atleta emprestado pelo
Sporting. E acrescentou que este falara, apesar da indicação em contrário, a de
não prestar declarações que envolvessem o seu clube de origem. Tudo isto foi
duplamente grave, quer pela forma censória que implicou, quer pela infeliz e
despropositada insinuação de que um atleta não deve bater-se pela sua
camisola... Então, que é feito da honra, do brio pessoal ou do
profissionalismo?
A
resposta foi digna e justa: Adrien Silva foi, no unânime entender dos que sabem
da coisa, o melhor jogador em campo. Quase
me apetece dizer: - Bem feito!!!
Apenas
me preocupa um pormenor com sérias incidências no futuro. Espero que a
serenidade regresse de vez à magnífica prestação de Sá Pinto e que este infeliz
episódio tenha sido uma excepção na sua actual norma de conduta.
Quero
com isto dizer: espero que Adrien Silva (e outros promissores quadros
sportinguistas por aí emprestados) possa trabalhar e jogar nas próximas épocas
na Academia e em Alvalade. Deixem que outros vasculhem o Brasil ou a Argentina,
o Chile ou o Paraguai, o Sahara ou o Bangladesh, dispensando dispendiosas
buscas em longes terras por aquilo que existe aqui mesmo à mão, e muito mais em
conta...
Então
o que é nacional já não é bom?
Enfim,
o fado lusitano, lamentavelmente e como é sabido, nem sempre acaba bem.
António Martinó de Azevedo Coutinho
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