António Martinó de Azevedo Coutinho
O texto é da
autoria da senhora ex-ministra da Justiça, Celeste Cardona, e foi publicado em
24 de Maio passado, no Diário de Notícias.
Sinceramente, achei o artigo em causa uma espécie de bem intencionada redacção,
porém redundante, algo vazio de propósitos consistentes e de objectivos
concretos. O título é A CONSOLIDAÇÃO E O
CRESCIMENTO e o mais interessante que nele encontrei -foi precisamente o me
chamou a atenção- residiu na ilustração aí implantada, a perfeito despropósito.
Sobre a legenda
“Não é possível crescer sem recursos
disponíveis para financiar o crescimento. Para dispor de tais recursos, ou
pedimos emprestado ou produzimos”, a imagem não deixava dúvidas: o
inconfundível par de altas e esguias chaminés da nossa “fábrica da rolha”, isto
é, da fábrica Robinson, de boa e
saudosa memória portalegrense...
O texto e aquela
sua aparente ilustração nada têm a ver um com a outra. Não são complementos, não
se referem reciprocamente, nem ali existe qualquer ligação lógica que recomende
tal justaposição. É uma imagem perfeitamente neutra, despropositada na sua
relação com o conteúdo do artigo ou, então, tratou-se duma simbólica aliança,
misterioso elo que se destinaria a suscitar interrogações ou a levantar dúvidas,
no entanto reduzidas ao universo dos leitores portalegrenses do tal artigo da
senhora ex-ministra.
Implicará a
legenda que se coloque à Robinson a
questão, ali expressa, de como poderá ela crescer sem recursos disponíveis para
financiar o seu crescimento?
E será legítimo
lembrar à Robinson que para dispor de
tais recursos terá de pedir emprestado ou de produzir?
Ora este
assunto, económico, está ultrapassado. Infelizmente, para toda a comunidade
portalegrense e não só, já não existe a fábrica Robinson (na citada imagem ainda funcionando com os tais fumos
negros e brancos que durante décadas encharcaram os céus lagóias com
“abençoada” poluição!); poderá implicar aquela “provocação” que se coloquem as
expressas questões (ou conselhos!?) a uma outra Robinson, de certo modo herdeira das gloriosas e honradas tradições
que uma nobre família inglesa aqui implantou e desenvolveu?
A Fundação Robinson, embora bem mais
recente, é uma instituição local com provas dadas. A sua consolidação e o seu crescimento
interessam a toda a comunidade e não têm passadas despercebidas algumas das
actividades e realizações de diversos tipos, como os sucessivos “dezassetes de Setembro”, dias em que
anualmente se mostra em particular (para de novo “hibernar”!?), ou como a
renovação patrimonial a que se tem vindo a entregar e que está à vista, por simples
e magnífico exemplo, no caso de São Francisco. É muito, é pouco, é o possível,
é o desejável? Isso não o sabemos bem, porque nos falta uma adequada informação.
Em termos de
opinião pública, e publicada, a última oportunidade de acesso aos projectos em
curso, por parte do seu principal mentor, ficou contida numa interessante
entrevista divulgada n’O Distrito de
Portalegre e datada de 26 de Julho de 2007. Quase cinco anos depois -é
tempo mais do que suficiente- apetece deixar aqui algumas interrogações sobre
os projectos, objectivos e ambições ali patentes, ou implícitos:
·
Onde e como
poderão os interessados ter acesso, fruir, e sobretudo adquirir as publicações
da Fundação?
·
Como poderão ser
consultados, ou a eles se ter acesso directo ou on line, os arquivos prometidos e, certamente, entretanto elaborados
e devidamente organizados?
·
Onde está a “fábrica
aberta”, em pleno funcionamento e com os próprios operários, no proclamado
espaço de cultura? Quando é inaugurado o Museu de Arqueologia Industrial
Robinson?
·
O financiamento
continua a vir da própria Fundação e da Câmara Municipal de Portalegre? Qual é o
papel, aí, da aportação do Conselho de Curadores, da Região de Turismo e do
Instituto Politécnico de Portalegre? Qual é a dimensão das sucessivas e
múltiplas candidaturas aos fundos comunitários europeus? Que outras muitas
potencialidades e que outros muitos atractivos para a Fundação se têm
efectivamente concretizado?
·
Que montantes
foram envolvidos, quando e como se gastaram, em que projectos e com que
implicados?
·
Que pessoal
altamente classificado, de dentro ou de fora de Portalegre, se tem constituído como
quadros da Instituição, uma vez que os semi-amadores e os profissionais medianos
não foram (e muito bem!) considerados?
·
Quantos dos
diversos nichos de emprego desencadeados -São Francisco, a Escola de Hotelaria,
a página WEB, o Museu de Arqueologia
Industrial, os Auditórios, a Realidade Virtual, os espaços para passear, etc-
quantos desses nichos contribuiram para compensar, entre nós, a praga do
desemprego?
·
Quando devidamente
se instalarão os Novos Habitantes no Espaço Robinson, transformando este numa
Fábrica de Cultura? Cito os
“candidatos”, da própria fonte oficial: Associação Juvenil Verdades, Escola de
Artes do Norte Alentejano-Conservatório Regional de Música, Escola de Hotelaria
e Turismo de Portalegre-Turismo de Portugal (este Novo Habitante já está efectivamente instalado!), Grupo Folclórico
e Cultural da Boavista, Orfeão de Portalegre, O Semeador-Grupo de Trabalho e
Acção Cultural de Portalegre, Qualifica-Associação Nacional de Municípios e de
Produtores para a valorização e qualificação dos Produtos Tradicionais
Portugueses, Sociedade Musical Euterpe e Teatro d’O Semeador-Associação de Animação
Cultural e Produção Teatral.
·
Para além do
extenso painel mural sobre o arquitecto Souto Moura, há meses estendido sobre a
fachada da velha fábrica, que dignidade lhe foi efectivamente concedida, em que
realidade se transformaram, de facto e não virtualmente, os seus projectos?
Em boa verdade,
muitas outras interrogações poderiam ser aqui e agora também formuladas, mas
estas são suficientes e representativas. Como é óbvio, não espero nenhum tipo
de resposta, nem isso tem qualquer importância. Apenas alarguei ao papel (ou à WEB) pensamentos e dúvidas que perpassam
pelo espírito de qualquer vulgar cidadão portalegrense minimamente interessado
pelo futuro da sua terra.
As angústias a
que vamos estando habituados vão-nos afastando, quase insensivelmente, do interesse
pelo conhecimento e pela discussão dos destinos da nossa comunidade. Temos de
inverter essa tendência, quase natural, e exigir contas a quem dirige, a quem promete,
a quem gere os cada vez mais escassos fundos comuns. Este é um inalienável
direito de cidadania, em vivência democrática. O alheamento colectivo tem
conduzido a nossa terra, e também o nosso país, pelos rumos infelizmente bem
conhecidos... Queremos continuar por aí?
Inspirado nos
ínvios ou talvez proféticos caminhos de um vulgar artigo de jornal, faço votos
de que, em vez de consolidação e crescimento, não constatemos na Fundação Robinson mais um caso local de diluição e enfraquecimento. É que nenhum de nós, e sobretudo Portalegre,
ganharia com isso...
António Martinó de Azevedo Coutinho
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home