António Martinó de Azevedo Coutinho
três – breve
colectânea da estupidez
Cada vez
acredito mais num “dogma” literário: os escritores não são apenas gente que
escreve bem; são sobretudo gente que pensa com invulgar elevação e que sabe
traduzir os seus pensamentos com qualidade literária. Aprendi isto com Régio e
tenho-o abundantemente confirmado.
Escrever bem, no
sentido de arrumar palavras com certo estilo, até um computador devidamente
programado “sabe” fazer... Comunicar-nos com clareza e profundidade coisas
superiores, mesmo quando inquietam, é próprio, apenas, de humanos excepcionais.
Rob Niemen e
Robert W. Service pertencem ao domínio destes eleitos. Ensinam-nos que a
“clássica” estupidez ocidental é a base do poder da maioria dos actuais políticos
europeus. Por outro lado, e sabemo-lo de passados tempos ainda mais tenebrosos,
esse seu poder reforça a perpetuidade da estupidez colectiva, em ciclo vicioso,
quando subtilmente retira ao povo as principais sedes do acesso à legítima
contestação: a educação e a cultura. Quando nos contentarmos, como as vacas, em
dormir, comer, beber e nunca pensar, teremos atingido a perfeição desejada
pelos políticos, ou seja, o grau máximo da estupidez.
A crença
definitiva nas suas promessas, o crédito absoluto nos seus programas e a
fidelidade inquebrantável para com as suas ideologias garantirão maciças
votações populares, em vitalícia e “democrática” (!?) permanência no poder dos “melhores”
(!?) de todos nós. Isto até já nos aconteceu e durou quase meio século...
Provavelmente, por
estas palavras, serei para muitos um exagerado ou um estúpido visionário. Talvez
mesmo um inesperado conspirador. Pois... é que a paciência e a tolerância têm
limites!
Martin Luther
King disse um dia: “Para criar inimigos
não é preciso declarar guerra, basta dizer o que pensa.”
É verdade, mas
não é tudo. A este propósito, entendo que dizer o que pensamos nos coloca em
paz com a nossa própria consciência e também serve para criar ou manter amigos.
A estupidez dos
homens tem sido tema tratado por pensadores, ao longo dos tempos. Tratando-se
dum sentimento ou duma filosofia de vida com larga adesão prática ao longo de
toda a crónica humana, natural se tornou, portanto, que inúmeras alusões,
algumas bastante curiosas e oportunas, tivessem sido expressas e registadas
desde há muito.
Sem qualquer
preocupação cronológica ou ideológica, aqui se deixam, em breve colectânea,
algumas exemplares máximas sobre a estupidez.
Comecemos por
Albert Einstein (1879-1955), o brilhante físico alemão, depois naturalizado
norte-americano, que dispensa qualquer outra apresentação. Ele escreveu: “Duas coisas são infinitas: o universo e a
estupidez humana. Mas, no que respeita ao universo, ainda não adquiri a certeza
absoluta.”
Na mesmíssima
linha esteve o historiador francês Ernest Renan (1823-1892), ao dizer: “A estupidez humana é a única coisa que dá
ideia do infinito.”
Já o médico e
apreciado dramaturgo russo Anton Tchekhov (1860-1904) afirmou: “A universidade desenvolve todas as
capacidades, inclusive a estupidez.”
Bertrand Russell
(1872-1970), matemático e filósofo inglês de reputação universal, dedicou ao tema
algumas das suas fabulosas reflexões. Eis duas delas: “A estupidez coloca-se na primeira fila para ser vista; a inteligência
coloca-se na rectaguarda para ver.” (...) “Um dos paradoxos dolorosos do nosso
tempo reside no facto de serem os estúpidos os que têm a certeza, enquanto os
que possuem imaginação e inteligência se debatem em dúvidas e indecisões.”
Gustave Flaubert
(1821-1880) foi um destacado escritor francês. É da sua autoria a seguinte afirmação: “A estupidez não está de um lado e o espírito
do outro. É como o vício e a virtude; sagaz é quem os distingue.”
O historiador e
filósofo alemão Friedrich Schiller (1759-1805) chegara ainda mais longe ao
declarar: “Contra a estupidez os próprios
deuses lutam em vão.”
Bertold Brecht
(1898-1956), inspirado dramaturgo alemão, legou-nos uma herança cultural dotada
de enorme impacto sócio-político. Aqui fica, para termo desta breve colectânea
sobre o disparate, um dos seus poemas dramáticos, Aos que virão depois de nós, alusivo à temática:
Uma linguagem sem malícia é sinal de
estupidez,
uma testa sem rugas é sinal de indiferença.
Aquele que ainda ri é porque ainda não
recebeu a terrível notícia.
Que tempos são esses, quando
falar sobre flores é quase um crime.
Pois significa silenciar sobre tanta injustiça?
Aquele que cruza tranquilamente a rua
já está então inacessível aos amigos
que se encontram necessitados?
É verdade: eu ainda ganho o bastante para viver.
Mas acreditem: é por acaso. Nado do que faço
uma testa sem rugas é sinal de indiferença.
Aquele que ainda ri é porque ainda não
recebeu a terrível notícia.
Que tempos são esses, quando
falar sobre flores é quase um crime.
Pois significa silenciar sobre tanta injustiça?
Aquele que cruza tranquilamente a rua
já está então inacessível aos amigos
que se encontram necessitados?
É verdade: eu ainda ganho o bastante para viver.
Mas acreditem: é por acaso. Nado do que faço
me dá o direito de comer quando
tenho fome.
Por acaso estou sendo poupado.
(Se a minha sorte me deixa, estou perdido!)
Dizem-me: come e bebe!
Fica feliz por teres o que tens!
Mas como é que posso comer e beber,
se a comida que como tiro-a a quem tem fome?
se o copo de água que bebo faz falta a quem tem sede?
Mas apesar disso, eu continuo comendo e bebendo.”
Por acaso estou sendo poupado.
(Se a minha sorte me deixa, estou perdido!)
Dizem-me: come e bebe!
Fica feliz por teres o que tens!
Mas como é que posso comer e beber,
se a comida que como tiro-a a quem tem fome?
se o copo de água que bebo faz falta a quem tem sede?
Mas apesar disso, eu continuo comendo e bebendo.”
Prolongaremos um pouco mais este breve ensaio sobre a estupidez.
António Martinó de Azevedo Coutinho
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