\ A VOZ PORTALEGRENSE: António Martinó de Azevedo Coutinho

quarta-feira, julho 13, 2011

António Martinó de Azevedo Coutinho

SPORTING  CLUBE  DE  PORTodo-o-mundo
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Sou do Sporting desde que me conheço e sempre serei do Sporting. Já o era o meu pai, são-no o meu filho e os meus netos. Portanto, trata-se dum caso genético, inserido no DNA familiar, incurável, definitivo.
Creio que, entre as várias gerações abrangidas por este ciclo genealógico, fui o mais afortunado. Quero com isto dizer que, na infância e na adolescência, pude viver em pleno as glórias de um clube ecléctico, campeão quase crónico em não sei quantas modalidades, nomeadamente no chamado desporto-rei, o futebol, sobretudo com a invulgar equipa dos 5 violinos que até eram 11. Um destes foi o nosso conterrâneo Carlos Canário, não o esqueçamos. Também se destacaria o sportinguista José Travassos, o primeiro português com entrada directa no universo europeu do pontapé-na-bola.
Por essa altura do campeonato, a universalidade do futebol dava passos ainda básicos, pelo que ao Sporting foi negada a evidência das posteriores Champions. Esta ficaria reservada ao Benfica de Eusébio e seus companheiros, depois substituídos pelo longo reinado nortenho de Pinto da Costa e sua corte. E o Sporting ficaria limitado a uma longa travessia no deserto, com uma ou outra brevíssima, modesta e passageira notoriedade. Como a Taça das Taças, por exemplo...
Atingiu-se recentemente o mais profundo da crise sportinguista, com o progressivo apagamento do seu clássico predomínio em algumas modalidades onde fora rei e senhor, como o andebol, o ciclismo, o ténis de mesa, a natação, o hóquei em patins ou o próprio atletismo, salvando-se o fenómeno, de fresca data e talvez efémero, que dá pelo nome de futsal...
Outro sinal da falta de confiança interna no futuro verde-branco, e este muito preocupante, respeita à quebra de rendimento da outrora fabulosa escola de praticantes (e de Homens!) que é a Academia. Na passada época futebolística, nenhum dos diversos escalões de formação ali existentes conseguiu qualquer triunfo a nível nacional. Pela primeira vez, na sua já longa história de sucessos...
Depois de recentes eleições, muito concorridas (o que é bom!) e muito atribuladas (o que é péssimo!), o Sporting acaba de sofrer uma reviravolta de 180 graus na sua tradicional política futebolística dita profissional.
O clube foi apresentando, um após outro, sucessivos nomes de praticantes, sob o rótulo de vedetas, recrutados um pouco por todo o mundo, dos Países Baixos até à Sul América. Reforços nacionais, vindos de outros clubes ou, sobretudo, da sua “escola” de jogadores, creio que nem o primeiro.
Quer dizer, o Sporting correrá o risco, imitando “glórias” alheias, de vir a apresentar em campo uma equipa de... estrangeiros! Aquilo que censurei, e censuro, em outros clubes portugueses, é agora uma possibilidade real no mundo sportinguista. Sporting Clube de quê?
Creio que toda a ambição, por mais legítima, tem um preço e impõe limites. Quando o país passa pelas restrições que todos sentimos, pode perguntar-se se o pequeno mundo indígena do desporto, mesmo do dito profissional, pode furar os esquemas de gastos e de poupanças que são impostos ao comum dos cidadãos e das organizações...
Os outros fazem isso e com algum sucesso? Talvez, porque lhes tem faltado a real capacidade, quase sempre revelada pelos leões, de criar e aperfeiçoar os seus próprios titulares. Senão, recapitule-se a proveniência da imensa maioria dos grandes jogadores que têm “emigrado” para os mais consagrados campeonatos na estranja. Nem é preciso recapitular os seus nomes, de Figo até Cristiano Ronaldo, numa lista já extensa e muito valiosa.
Naturalmente, pode perguntar-se por que aconteceu tal êxodo, mas essa já é outra história, que passa pela debilidade dos sucessivos elencos directivos e pelas fragilidades globais do próprio país.
Enfim, bem feitas as contas, poder-se-á chegar ao absurdo de encontrarmos mais jogadores portugueses a jogar, efectivamente, em equipas titulares de alguns grandes do futebol europeu que nos principais clubes nacionais, Sporting incluído.
O presidente do clube terá pedido aos jogadores “para honrarem as camisolas”. Será que aqueles as conhecem, isto é, será que sentem o seu historial, o seu valor e o seu significado? Por outro lado, foi garantido pela imprensa que ele usou “cheque e vassoura” nesta operação. Não teria sido mais eficaz, e mais económico, contratar uma empresa especializada em limpezas?
Vai funcionar esta revolução? Por outras palavras, será o SCP capaz de oferecer mais luta, poderá o clube entrar na séria disputa dos torneios e campeonatos onde vai participar, conquistará algum lugar cimeiro nos respectivos pódios? Talvez, mas tal não é garantido. Para isso, Domingos terá de juntar à sua Paciência uma boa dose de ciência, de clarividência, e talvez mesmo de impertinência.
Segundo a imprensa, ele terá afirmado, logo no primeiro dia de treinos: “Já temos os jogadores. Só falta a equipa.” Pois, essa é exactamente a sua nada fácil tarefa.
Já agora, não seria mau de todo dispôr de uma boa equipa de tradutores simultâneos, de preferência especialistas em linguagem gestual. Com os pés, mas sobretudo com a cabeça... e o coração.
António Martinó de Azevedo Coutinho