António Martinó de Azevedo Coutinho
6 – HÁ SEMPRE ALGUÉM QUE RESISTE
HÁ SEMPRE ALGUÉM QUE DIZ NÃO
Nem tudo é negócio, nem tudo é cupidez, nem tudo é insensibilidade. As 7 maravilhas da gastronomia não esgotam, felizmente, a abordagem pública à cozinha portuguesa, mais ou menos típica.
Ao mesmo tempo que as grandes parangonas promovem a fase eleitoralista do concurso, há quem, mais discretamente, procura tratar-nos da saúde. Sem ironia.
Por exemplo, ao texto promocional das “maravilhas” culinárias há quem proponha um outro, alternativo, provavelmente mais chato, certamente mais sensato. É assim:
“Há dois milhões de pessoas com fome em Portugal. São pessoas com grandes dificuldades económicas. Mas não é só uma fome de quem não come, é uma fome de quem come mal. São carências de ferro, cálcio, iodo, vitaminas e outros nutrientes essenciais para o bom funcionamento do nosso corpo. É uma fome que nasce das más escolhas alimentares e que mata aos poucos.
Destrói o aproveitamento escolar, causa diabetes, complicações cardiovasculares, facilita infecções, obesidade e outros problemas de saúde. Mas o mais curioso é que esta fome é mais fácil de matar do que parece. Mata-se com uma alimentação equilibrada, não comendo só doces e gorduras e não exagerando nos refrigerantes. Mata-se com os nutrientes que estão na comida caseira. Comida que até é mais barata pois sai mais barato fazer uma refeição completa em casa do que comprar um pacote de bolachas. E é a comer bem que se pode ajudar a acabar com esta fome.”
Quem são os autores deste manifesto?
Trata-se duma iniciativa promovida pela Fundação Gulbenkian, pela Fundação EDP e pela SIC, contando com o apoio da DECO e da Associação Portuguesa de Nutricionistas. A coordenação científica do projecto, que tem a designação geral de COMER BEM É MAIS BARATO, pertence à Prof.ª Isabel do Carmo.
Sabe-se, de há muito, que tem vinda a ser progressiva a deterioração dos hábitos alimentares dos portugueses. Como é óbvio, a crescente crise económica e social constituiu um factor de dramático agravamento desta situação, pela penúria de recursos materiais, pelo pouco tempo disponível, pela falta de informação oportuna e credível, até mesmo pela ausência de motivação para serem melhorados os hábitos de confecção e de consumo dos alimentos.
Naturalmente, a imposição de valores como os veiculados pelas 7 maravilhas em nada contribui para melhorar este deprimente panorama... Bem pelo contrário!
O grupo empenhado nesta “alternativa” campanha estudou profundamente as implicações da grave questão, não apenas dum ponto de vista teórico (que é uma das especialidades nacionais!), mas sobretudo num plano essencialmente pragmático, com apresentação de pistas válidas e bem concretas.
Subordinando-se ao objectivo central de propôr uma alimentação saudável ao alcance de todos os bolsos, a campanha pretende ensinar os portugueses a fazer uma refeição completa, com sopa, prato principal e sobremesa (“faltam” a entrada, o marisco e a caça!) por apenas um euro. Este valor parece, de facto, constituir uma relativa insignificância, uma utopia, mas é avalizado pela DECO. A instituição deu-se ao meticuloso trabalho de recolher e comparar cerca de 1300 preços diferentes de artigos alimentares de primeira necessidade e depois calculou valores médios tendo por base as ofertas mais baixas de cada estabelecimento visitado.
Um jovem chef culinário e a sua equipa têm percorrido vários mercados em diversas cidades do País. Infelizmente, como aliás é costume, Portalegre fica fora do circuito. Mas os portalegrenses interessados não ficarão fora do processo; basta procurarem o sítio, na internet, onde tudo fica registado, desde as sugestões de ementas e as receitas dos pratos até uma completa informação sobre nutrição equilibrada, saudável e... acessível. Eis o seu endereço:
http:www.comerbememaisbarato.com/
Isabel do Carmo, uma indiscutível autoridade nacional no sector do nutricionismo, é a principal responsável pela criação das ementas, onde a preocupação fundamental consiste em que contenham todos os nutrientes necessários à manutenção de um estilo de vida saudável. Desejavelmente, a solução ideal seria a de um progressivo regresso ao tipo de cozinha tradicional na bacia do Mediterrâneo, com base em azeite, frutos e legumes frescos e com consumo moderado de produtos lácteos, carne e peixe. Em todos estes alimentos, a campanha em curso procura identificar os que, pelo seu preço reduzido, melhor se poderão encaixar nas presentes dificuldades orçamentais das famílias portuguesas.
Mesmo sem votos, mesmo sem sete pratos, que tais estas maravilhas?
António Martinó de Azevedo Coutinho
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