\ A VOZ PORTALEGRENSE: António Martinó de Azevedo Coutinho

sexta-feira, maio 13, 2011

António Martinó de Azevedo Coutinho

1 – UMA LINHA LÓGICA A CAMINHO
DA IMBECILIDADE COLECTIVA

O concurso foi anunciado com as parangonas do estilo nos sítios do costume, isto é, nos chamados meios de comunicação social mais aptos à divulgação das banalidades ditas sociais, TV’s e não só.
Sete, o número 7, é uma espécie de amuleto, mágico, que funciona na perfeição entre nós. A sua aura vem de tempos imemoriais e ainda não se extinguiu, bem pelo contrário. A numerologia, “ciência” tão exacta como a astrologia, por exemplo, serve-se dele para justificar as suas bases e já Pitágoras, segundo consta, lhe chamou sagrado, perfeito e poderoso.
A Bíblia e o Catecismo Católico, convenientemente interpretados, confirmam tal rigor, que se mantém portanto como verdade quase absoluta: sete pecados capitais, sete virtudes divinas, sete sacramentos, sete dons do Espírito Santo, sete Obras de Misericórdia, sete arcanjos, sete igrejas iniciais do Cristianismo...
O mundo dito profano, na sua imensa diversidade, regista, por exemplo: sete braços no candelabro judeu, sete notas na escala musical em vigor, sete cores no arco-íris, sete glândulas endócrinas, sete jogadores numa equipa de andebol, sete dias na semana, sete meios -segundo o budismo- para o homem se tornar puro, sete colinas em Lisboa e também em Roma, sete pedras de dominó na mão, sete anões a acompanhar a Branca de Neve, o diabo a sete ou... fugir a sete pés!
Como as sete maravilhas do mundo antigo já tinham caído em desuso -algumas estavam mesmo extintas de todo-, alguns sábios contemporâneos reuniram-se em conclave e decidiram montar um excelente negócio a que concederam a pomposa designação de New 7 Wonders Foundation, com sede oficial em Zurique. Sob o alibi de criar uma memória colectiva, com sete pretextos para recordar e unir, respeitando, honrando e celebrando a diversidade cultural do nosso planeta comum -que bonito!-, a sua primeira demonstração pública de vitalidade foi a organização do concurso das sete maravilhas do mundo moderno, aqui solenemente proclamadas, no Estádio da Luz, em 7 de Julho (mês 7) de dois mil e... sete.
E, como as pragas do Egipto também foram sete, toca a espalhar estas novas epidemias do espectáculo, pelo menos até este número mítico.
Na nossa proverbial tradição de copiar tudo o que de fora nos impingem -como bom e útil!- temos sido exemplares alunos dos mestres suiços. Senão, veja-se o que já macaqueámos a tal propósito:
• Sete Maravilhas (arquitectónicas) de Portugal (2007)
• Sete Maravilhas Naturais de Portugal (2009)
• Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo (2010)
• Sete Maravilhas Gastronómicas de Portugal (2011)
Como ainda há lugar, no mínimo, para mais três funções congéneres -embora com estas últimas “maravilhas” ainda em pleno curso- desde já aqui se sugere (de borla!) uma pequena lista indicativa, para prévia apreciação pelos putativos organizadores:
• Sete Artigos mais Maravilhosos do Artesanato de Portugal
• Sete Danças mais Maravilhosas do Folclore de Portugal
• Sete Tintos mais Maravilhosos da Copofonia de Portugal
• Sete Vedetas mais Maravilhosas do Cançonetismo de Portugal
• Sete Políticos mais Maravilhosos dos Partidos de Portugal
Atempadamente, e a título de prudente e oportuno aviso, lembra-se o risco de tornar excessivamente “democrática” a decisão popular. É que não se deve esquecer o que aconteceu em similar “votação” -não de sete mas de dez nomes!-, quanto ao pretexto dos Maravilhosos, perdão!, dos Grandes Portugueses.
Lembram-se? Foi entre 2006 e 2007 e deu o resultado que aqui se recorda:
• António de Oliveira Salazar – 41%
• Álvaro Cunhal – 19,1%
• Aristides de Sousa Mendes – 13,0%
• D. Afonso Henriques – 12,4%
• Luís Vaz de Camões – 4,0%
• D. João II – 3,0%
• Infante D. Henrique – 2,7%
Além destes sete, foram “suplentes”: Fernando Pessoa, 2,4%; Marquês de Pombal, 1,7% e Vasco da Gama, 0,7%.
António Martinó de Azevedo Coutinho