\ A VOZ PORTALEGRENSE: António Martinó de Azevedo Coutinho

segunda-feira, abril 23, 2012

António Martinó de Azevedo Coutinho

JOSÉ RÉGIO VOA PELOS CÉUS DA EUROPA

Pode parecer um estribilho, mais ou menos místico, mais ou menos simbólico, evocando um ressoar da aura do poeta pelos universos cultos do Velho Mundo. Nada disso. O título é rigoroso, exacto, e algo distante da poesia e do simbolismo: José Régio voa, de facto, pelos céus da Europa. Também dos nossos, caseiros, porque, para o bem e para o mal, somos Europa... Até me atrevo a prognosticar que talvez haja uma grande probabilidade de ele voar, de vez em quando, sobre o próprio céu desta Portalegre onde viveu, sonhou, sofreu e criou a maior parte da sua obra. Acontece que a nossa cidade fica numa rigorosa vertical de algumas rotas aéreas de e para a Europa central, situando-se na serra um rádio-farol inserido na rede de orientação e de apoio aos voos comerciais.
É que José Régio também é um avião, mais concretamente um Airbus A320, dos que recentemente reforçaram a frota da transportadora aérea nacional, TAP.
Aqui há dias soube esta notícia pelo meu neto Manuel, quando voou para Londres. Interrogou-me depois, em estilo de provocação, sobre o nome do avião onde viajara. E, perante a minha natural ignorância, forneceu-me a resposta: José Régio! Naturalmente, ele conhece há muito o meu particular apreço pela memória do Homem e da Obra, não duvidando, portanto, de que tal revelação me seria grata.
Em boa verdade, todos sabemos que o nome de “baptismo” de naves ou aeronaves costuma servir de homenagem a vultos significativos da História ou da Cultura nacionais. É assim em todas as latitudes. O que talvez nem todos conhecêssemos -eu não o sabia!- era o facto de também ter chegado a vez do nosso Régio ser distinguido como patrono de um recente e moderno avião. E afinal isso já aconteceu há três anos, pois aquela aeronave de médio curso, com capacidade para 180 passageiros, foi recebida em Fevereiro de 2009...
Aqui fica apresentado, com o número de matrícula CS-TNQ 3769. Diz a ficha técnica que a sua engenharia construtiva possibilita um acréscimo de eficiência energética e ambiental de cerca de 8%. Acrescenta a TAP que este aparelho permitirá uma redução de emissões anuais de 2200 toneladas de dióxido de carbono e uma poupança de combustível na ordem das 700 toneladas.
Podemos ficar orgulhosos: José Régio ficará aqui associado à utilização de práticas e de tecnologias eco-suficientes que conciliam o crescimento com a protecção do Ambiente. Que nos lembre, nunca no passado, em vida ou depois dela, foi o autor da Toada de Portalegre lembrado como militante das causas ambientalistas. Aconteceu agora.
O “pacote” de aviões desta “família” incluiu outras nomenclaturas como Luísa Todi, Mouzinho de Albuquerque, Almada Negreiros, Aquilino Ribeiro, Florbela Espanca, Teófilo Braga, Vitorino Nemésio, Natália Correia, Gil Vicente, Alexandre O’Neill, Luís de Freitas Branco, D. Afonso Henriques, Rafael Bordalo Pinheiro, Columbano Bordalo Pinheiro, Grão Vasco e Eugénio de Andrade. Como se pode avaliar pela extensa relação, Régio fica em muito boa e diversificada companhia... Para já, este apreciável conjunto de novíssimas aeronaves serve algumas linhas existentes e opera nas mais recentes ligações da TAP com Moscovo, Varsóvia e Helsínquia, por exemplo.
O meu conhecimento deste facto não se resumiu à súbita e agradável revelação. Acabei de receber, dessas mesmas mãos familiares, a mais recente edição da revista de bordo da nossa companhia aérea, a UP. Quem esteja habituado a voar conhece as publicações que qualquer operadora coloca à disposição dos passageiros, fornecendo-lhe as mais diversas informações sobre a empresa, recursos turísticos, culturais, publicidade inerente e outros textos e imagens, sempre em língua “nativa” e na inglesa, com uma superior qualidade gráfica.
A UP relativa a Abril de 2012 inclui duas páginas (156 e 157) dedicadas a José Régio, na sua secção A Nossa Frota.
Num artigo que está a correr o Mundo, pelo menos a substancial parcela deste onde a TAP chega, o nosso maior vulto cultural vai dispor duma considerável e digna divulgação. O texto alusivo é curto e até conta com algumas incorrecções de pequena monta: Régio recebeu o Prémio Diário de Notícias em 1961 e não em 1966; vendeu o espólio da sua casa de Portalegre em 1964 e não em 1965; não foi aqui professor durante quase quarenta anos, mas 33 e incompletos; deixou muito mais colaboração no jornal O Primeiro de Janeiro do que em O Comércio do Porto e aquele, ao contrário deste, nem sequer é citado...  Enfim, deficiências da Wilkipédia que não anulam o interesse nem a validade desta oportuna divulgação.
Régio voa agora pelos céus da Europa e os ecos desta sua novíssima “aventura” ressoam por todo o Mundo... Esta é uma curiosa realidade onde se partilham a homenagem e a modernidade, numa dimensão quase insólita mas justa.
José Régio, de facto, continua vivo.
António Martinó de Azevedo Coutinho