Luís Filipe Meira
Wraygunn no CAEP
A Estrada Perdida
Foi há alguns anos atrás, o Dr. Mário Soares era Presidente da
República e dedicou uma das suas presidências abertas ao interior do país,
percorrendo algumas capitais de distrito para, numa política de proximidade, se
inteirar dos problemas inerentes à interioridade. A piada – se é que tem alguma
– é que a presidência aberta começou em Beja, seguiu para Évora e saltou para
Castelo Branco, deixando Portalegre a caçar gambozinos. Cito a história de memória
e se bem me recordo falou-se na altura, que a ação foi desviada por um assessor
portalegrense de Mário Soares, que não tinha boas relações com as autoridades
locais da época. Este pequeno episódio é apenas um exemplo entre muitos
similares, sobre esta cidade situada à beira duma estrada perdida a caminho
de nenhures, cuja auto estima já viu melhores dias e que também já pouco se
preocupa com aqueles que por aqui ainda se vão perdendo.
Este episódio ocorreu-me na noite do último sábado, ao entrar no
grande auditório do CAEP, para assistir ao concerto dos Wraygunn de
apresentação de L´Art Brut, o novo
álbum do grupo de Paulo Furtado e deparar com uma sala desoladoramente vazia em
confronto com um palco cheio de instrumentos. Não acredito que em Portalegre
não haja duas, três ou mesmo quatro centenas de pessoas que gostem de
rock´n´roll a sério e possam gastar dez euros num bilhete. Afinal os Wraygunn,
a banda de Paulo Furtado a.k.a The Legendary Tiger Man, têm 1 EP e 4 álbuns, já
andam há 13 anos na estrada, aqui e lá fora, e não devem nada, antes pelo
contrário, aos Velosos, Xutos & Cº Lda. Pois são muito mais genuínos como o
disco L´Árt Brut o prova à saciedade. L´Art Brut não é Arte Bruta mas sim
uma espécie de “busca do Paraíso” como os próprios Wraygunn o definem. É um
disco mais contido, mais subtil que o anterior Shagri-La mas, ainda assim um
disco de puro rock´n´roll, onde uma poderosa secção rítmica - bateria,
percussão, baixo e guitarra - prepara o campo de explosão para as divagações da
guitarra e a agressividade da voz de Paulo Furtado, sendo tudo isto polvilhado ou
equilibrado, se quiserem, pela soul nas
vozes de Raquel Ralha e Selma Uamusse.
E chegamos ao concerto. Sala quase vazia, talvez um quinto da
lotação, o palco ocupado por 7 músicos que ignorando a frieza da sala,
avançaram como se a lotação estivesse esgotada.
Paulo Furtado reconhece que L´Art
Brut é um álbum muito fácil de transpor para o palco, porque é simples,
direto e foi quase todo gravado “live” no estúdio. Foi o que assistimos no
passado sábado no CAEP, a transposição para palco dum magnífico álbum, o que só
poderia terminar num magnífico concerto onde Paulo Furtado ainda deixaria a sua
marca pessoal, invadindo a plateia e quase obrigando as pessoas a saltarem para
a frente do palco e dançarem. Afinal estávamos num concerto de rock´n´roll…
O concerto, conforme disse, foi magnífico, a dúvida que me fica é
se os Wraygunn num futuro próximo irão encontrar a Estrada Perdida
para um regresso a Portalegre. E aqui cabe-me fazer votos para que esta cidade
não desapareça num vortex temporal, como aconteceu a Pete Dayton no filme de
David Lynch, “A Estrada Perdida”…
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