António Martinó de Azevedo Coutinho
Uma das questões mais interessantes nos domínios deste tipo de publicidade refere-se ao seu público-alvo, ou seja, aos seus destinatários.
E, aqui e agora, este exemplo Astérix/McDonald’s ganha novas e significativas ressonâncias e por diversas razões conjugadas. Temos a considerar, nesse universo público-alvo, a mudança que a empresa vem processando ao longo da sua existência, das crianças aos jovens e, agora, aos próprios adultos, naquela zona etária indefinida entre o ainda jovem e o já quase adulto. Se acrescentarmos a crise da multinacional em face das sucessivas contestações (e em França estas têm atingido níveis consideráveis!) quer políticas quer dietéticas, teremos um retrato -e ainda incompleto- duma delicada situação económica, que terá conduzido a esta campanha, porventura em desespero.
Em França, a publicidade que envolve a figura mítica de Astérix cria um campo simbólico entre o anunciante e o seu público, apto a transformar magicamente o produto num sentimento. Panoramix não estará, portanto, de todo ausente...
As crianças e os jovens são inseridos numa rede de decisão colectiva dotada de apreciável poder de interferência no próprio consumo familiar, associando facilmente os jovens-adultos, estes mesmos já pré-aderentes ao fenómeno Astérix.
Se a cadeia multinacional McDonald’s conseguisse introduzir aqui um novo hamburguer de carne de javali, o sistema produção-distribuição-consumo funcionaria na perfeição quase absoluta, encaixado numa moderna lógica capitalista onde a própria cultura de massas se articularia com as leis do mercado...
Novamente se devem aqui realçar as mais-valias da publicidade que utiliza a BD, porque esta reduz as limitações impostas pela natureza física dos meios escolhidos, porque leva o leitor a interpretações múltiplas, porque “fala” de outras coisas importantes para além do próprio produto e porque não apresenta este, de uma forma explícita, ao consumidor. Por outras palavras, o hamburguer, a coca cola, as batatas fritas e o ketchup surgem aqui de um modo quase subliminar, perante a dimensão do “mito” Astérix.
A assimilação da mensagem é facilitada pela economia do processo. A cena usada, um simples cartoon ou vinheta onde se resume toda a “mitologia”, tornou-se familiar porque condensa numa imagem as fundamentais informações desejadas pelo emissor, tal como nas histórias de Astérix. Daí, a sua poderosa força persuasiva junto dos receptores, de que não serão por ora abordadas as questões éticas subjacentes. Esta é uma outra e distinta “guerra” que, aqui, não travaremos...
E, como estas questões são como as cerejas, quer dizer, a gente puxa por uma e vêm outras agarradas, apetece agora perguntar se, como veículo ou suporte publicitário, a BD pode servir com eficácia para todas as idades. A resposta, se utilizarmos a “lógica” inventada por Hergé, será a de que abarca todos os consumidores, entre os 7 e os 77 anos... Naturalmente, sem ironias, poderemos considerar que depende sempre dos interesses em causa, assim como dos gostos e hábitos dominantes em cada nível etário.
Mais uma vez, o caso Astérix/McDonald’s -pretexto próximo destas considerações- servirá de exemplar paradigma, uma vez que o fenómeno sócio-cultural centrado no insubmisso guerreiro gaulês abarca quase todo o universo francófono, e não só... Tudo isto não estabelece qualquer contradição com as reflexões anteriores, aparentemente mais restritivas.
Sem excessivas preocupações cronológicas e sem rigoroso enquadramento temático, será interessante -e pedagógico- analisar com brevidade alguns outros exemplos das curiosas interligações entre banda desenhada e publicidade, quer entre nós, quer no restante universo dos quadradinhos.
António Martinó de Azevedo Coutinho
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