\ A VOZ PORTALEGRENSE: Ensino da História em Portugal

sábado, setembro 13, 2008

Ensino da História em Portugal

Fidel é um ditador ou apenas uma vítima do imperialismo americano? O maoismo foi uma máquina de morte ou tinha apenas como “objectivo o afastamento dos opositores ao regime”, mas sempre “apoiado por muito jovens chineses”? Os manuais do 9.º e 12.º anos, que abrangem a História do século XX e que receberam o aval do Governo para entrar no mercado, contêm exemplos de catequização ideológica de extrema-esquerda evidente. Nem todos, é certo, mas a maior parte. Quando a SÁBADO começou a pedir comentários a alguns excertos, as reacções foram de incredulidade, indignação ou, demasiadas vezes, uma gargalhada. E por cada exemplo, muitos ficaram de fora.
A SÁBADO contactou as editoras para obter reacções, mas até ao fecho da edição apenas a Areal respondeu. Joana Cirne e Marília Henriques, autoras do Cadernos de História 9, justificam uma citação sobre Mão com a “necessidade de apresentar um texto menos denso e considerando a faixa etária dos alunos - isto não significa que o aluno veja o seu conhecimento limitado ao manual escolar, cabe ao professor aprofundar os temas”, E pode haver informações “implícitas em imagens documentais e respectivas legendas”. A imagem em causa é do massacre de Tiananmen, não do período maoista.
O desvio ideológico não vem sozinho. Há também erros factuais e contradições. Por exemplo: na quinta-feira negra, 24 de Outubro de 1929, venderam-se 16 milhões de acções (O Tempo da História, 12.º ano, Porto Editora), 13 milhões (Novo História 9, Texto Editora) ou apenas milhares (Cadernos de História 9, Areal Editores)? A guerra da independência em Angola começou com os massacre da UPA (O Tempo da História, Porto Editora) ou quando o MPLA assaltou a prisão militar em Luanda (Caminhos de História, 12.º ano, ASA)? Pode ser que não saia no exame.
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Os sucessos da URSS
“Qualquer que seja o modo como se encare a filosofia comunista, a verdade é que devem ser-lhe creditadas realizações positivas na Economia, domínio em análise: uma acentuada melhoria dos métodos agrícolas e do rendimento do solo, expansão considerável da industrialização; introdução da planificação que tem, pelo menos, a vantagem de evitar a superprodução.” Caminhos da História, 12.º ano, volume I, ASA
COMENTÁRIO “Essa afirmação é absolutamente chocante. É como dizer que, independentemente da forma como se veja escravatura, ela permitiu razoáveis produções de algodão no Sul dos EUA”, afirma Luís Aguiar Conraria, professor de Economia da Universidade do Minho. Os regimes de Leste “tinham era subprodução”. Quanto à superprodução, no mundo ocidental quando existe, sabe-se “porque os preços baixam - naqueles países esse mecanismo não funcionava.”
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McCarthy igual a Estaline
“Se, na URSS, a acção de Estaline provocou milhares de mortos e a deportação de milhões de pessoas para campos de trabalho forçado na Sibéria, nos EUA a perseguição ao suspeitos de simpatizarem com o comunismo e de promoverem actividades antiamericanas transformou-se numa verdadeira “caça às bruxas” que ficou conhecida por maccarthismo.” Novo História 9, Texto Editores
COMENTÁRIO A professora universitária Maria Filomena Mónica é taxativa: “O paralelismo entre um facto e outro é de tal forma aberrante que custa a crer que a frase apareça em manuais de História à venda em 2008: o assassinato de milhões de indivíduos na URSS não pode ser comparado; que se passou nos EUA durante os anos 50 em que nenhuma das ‘bruxas’ foi queimada.” O especialista em política internacional Miguel Monjardino reforça: “Não foram milhares de mortos, foram milhões. É quase obsceno fazer uma equivalência moral entre este e o maccarthismo, que foi um episódio infeliz, mas limitado no tempo e no número de pessoas perseguidas.”
P. 58, 11 SETEMBRO 2008 SÁBADO