Mário Silva Freire
PARA UM DESENVOLVIMENTO SOLIDÁRIO
O Tuiavii e o Papalagui (1)
Papalagui é o nome dado ao homem branco, nos discursos que Tuiavii, chefe de uma tribo das ilhas Samoa, na Polinésia, destinou aos seus compatriotas. Estes discursos vêm na sequência de uma viagem que ele efectuou à Europa, no século passado, os quais foram, depois, recolhidos e publicados pelo alemão Erich Scheurmann.
Tuiavii relata, de uma maneira simples mas incisiva, alguns aspectos que observou, relativamente ao viver do homem branco e que na Semana da Pastoral Social foram, num breve apontamento, referidos.
Ele observa, nos prédios das grandes cidades, famílias que nada sabem das outras que lhes estão ao lado “como se houvesse entre elas, não apenas uma parede de pedra mas ilhas e inúmeros mares (…) e, quando se encontram, cumprimentam-se de má vontade ou zunem, quais insectos hostis, como se estivessem zangadas…”
Referindo-se ao Deus do homem branco, diz que “…o missionário proclama que Deus é amor e que um bom cristão deve ter sempre presente a imagem do amor no seu espírito. (…) Mas a verdadeira divindade do homem branco é o metal redondo e o papel forte a que ele chama dinheiro. Quando se fala a um europeu do Deus do amor, ele faz uma careta e sorri (…). O dinheiro é o objecto do seu amor, o dinheiro é a sua divindade”.
Diz Tuiavii que, segundo o Papalagui “necessitamos de muita ajuda e piedade, em virtude de não possuirmos coisas (…) Quem, realmente, será mais rico e possuirá mais coisas do Grande Espírito do que nós? Passeai os olhos à vossa volta, até ao longínquo horizonte, onde a grande abóbada azul se apoia na borda da terra: está tudo cheio de grandes coisas (…); para quê criar ainda mais, para além das coisas sublimes que o Grande Espírito nos dá?”
E quanto à vida frenética que os ocidentais levam? Não têm tempo para nada! O Papalagui “corre sempre de braços estendidos, não concede ao tempo o repouso necessário, não o deixa apanhar um pouco de sol…Mas o tempo é calma, é paz e sossego, gosta de nos ver descansar, estendidos na nossa esteira…”
Não podemos, nos dias de hoje, ocidentais, conceber que se possa retornar ao modo de viver dos habitantes da Samoa. Não deixam, no entanto, de nos interpelar as observações que Tuiavii faz à carência de qualidade das relações interpessoais, à perda de humanidade que elas implicam, à ambição desmesurada pelo ter e à progressiva deterioração dos valores do bem, do belo e do respeito pela Natureza. Afinal, onde se encontra a felicidade? Será que, com a crise que estamos a viver, Tuiavii não estará a prenunciar uma nova era para a humanidade?
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