Jorge Luís Lourinho Mangerona
“Quando o mar bate na rocha…”
Desde que se acabaram as especiarias, e depois o ouro do Brasil, vivemos em constantes apertos. Vivemos é um eufemismo, porque isto de apertos tem muito a ver com o ditado popular:”Quando o mar bate na rocha quem se lixa é o mexilhão”. O problema é que o mexilhão somos quase todos nós. Por esse mundo fora, sejam liberais, socialistas ou comunistas que estejam no governo, a receita é mais ou menos idêntica e o povo vai suportando os ditames de meia dúzia de iluminados. Iluminados, salvo seja, que o tempo é de trevas e escasseiam homens de estado para quem o serviço público esteja acima de interesses pessoais ou partidários. É esta a razão porque as contas públicas têm mais buracos que um queijo suíço. Se os gastos forem com automóveis topo de gama, com arranjos florais ou jantares, despesas de representação ou cartão de crédito, publicidade ou assessorias, prémios a gestores de empresas públicas ou outras mordomias, são minudências que não têm influência no orçamento, se for o aumento de um ou dois cêntimos no ordenado de um desgraçado que ganha quatrocentos euros, ai Jesus… que o deficit dispara e os malandros que nos emprestam o dinheiro para comer querem mais juros. As receitas prescritas para a desgraça são sempre as mesmas e esta gente não aprende com os erros. Vejamos um exemplo: o encerramento de maternidades e centros de saúde que foi apresentada como uma medida que não só melhoraria a qualidade dos serviços prestados, como também se traduziria numa racionalização de meios e diminuição dos custos. Encerraram-se maternidades e centros de saúde e, entretanto, o buraco do orçamento do serviço nacional de saúde disparou! Pudera…convido-os a passar uma manhã, ou uma tarde, pelas proximidades do hospital ou a sentarem-se numa esplanada da zona (passe a publicidade) e a contar o número de ambulâncias que entram e saem. São ambulâncias de Sousel, Fronteira, Ponte de Sor, Avis, Nisa, etc… que num corrupio constante se deslocam das respectivas localidades para o hospital. É preciso notar que algumas destas localidades se situam a setenta ou mais quilómetros de Portalegre e que fazem viagens de ida e volta, duas ou três vezes por dia. Não será preciso fazer cálculos muito complicados para tirar conclusões acerca desta “poupança”... isto para não falar das consequências para a qualidade dos serviços prestados devido a este aumento da procura. Passe pelos corredores dos serviços de urgência e veja quantas camas há nos corredores ou agradeça a Deus por não ter problemas em momentos de grande afluência. Nestas condições a humanização dos serviços é “apenas” um pormenor, pois não há profissional que resista a tanta confusão. Em suma: as medidas que visavam a racionalização dos recursos e diminuição dos custos traduziram-se num alargar do buraco que, um dia, acabará por engolir o Serviço Nacional de Saúde e quanto à melhoria da qualidade dos serviços o mexilhão que se pronuncie. E, entretanto, o mar vai continuar a bater na rocha e o Zé mexilhão lá estará…
Jorge Luís Lourinho Mangerona
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