\ A VOZ PORTALEGRENSE: Jorge Luís Lourinho Mangerona

quarta-feira, outubro 20, 2010

Jorge Luís Lourinho Mangerona

NÓS POR CÁ…

Se a desgraça é geral não seria de esperar vivermos num mar de rosas. Só que até a desgraça parece atingir com mais intensidade os mais desgraçados. O esquecimento a que o Poder Central nos tem votado é secular e, seja qual for o governo, nem as moscas mudam. Nem vale a pena referir o rol de promessas não concretizadas, pois são tantas que qualquer tentativa de enumerá-las seria exercício cansativo. O que magoa é assistir à concretização das promessas nas casas dos vizinhos do lado que, no meio da tempestade geral, conseguem sempre passar por entre a chuva sem se molhar. Tem sido o caso das cidades de Évora ou de Castelo Branco que, por razões nem sempre claras, têm evitado os custos da interioridade que parecem atingir especialmente Portalegre. Vou deixar de lado o número de ministros e secretários de estado que cada uma das cidades tem dado a sucessivos governos porque, julgo eu, os governos e os ministros têm carácter nacional e não representam interesses regionais ou outros (não se riam por a questão é séria… mas podem sorrir!); vou deixar de lado influências e alinhamentos partidários dos executivos camarários porque, prosseguindo o bem comum, não podem ser penalizados por não pertencerem ao partido que, no momento, governa (podem continuar a sorrir…); vou deixar de lado o diminuto número de deputados que nos representa porque esta é uma questão de regime que urge resolver com uma nova lei eleitoral… Poderia continuar “a deixar de lado” milhentas razões mas chega… Chega, porque é este “deixar de lado”, é este “deixa andar” que está a levar a cidade a um estado de desenvolvimento que nos coloca em patamares impensáveis para quem a escolheu para viver. É claro que já ouço as Cassandras de serviço: “porque é que este se lembra agora, neste momento difícil, do desenvolvimento da cidade?”. Em primeiro lugar, ando há mais de vinte anos a dizer que não me serve uma descentralização que leva os serviços da Fonte da Boneca para a Praça do Geraldo (dez anos de crónicas na Rádio S. Mamede espelham esse posicionamento); em segundo lugar acredito no ditado “grande nau, grande tormenta” e a nossa sempre é uma nau mais pequena, finalmente, é um lugar-comum mas talvez seja verdade, há momentos de crise que são momentos de oportunidade. A verdade é que temos potencialidades que temos esquecido. Embalados pela história que nos referia como uma das poucas cidades do interior com indústria significativa, fomos desprezando outros recursos, essencialmente ligados à agricultura, que poderiam ser a base de um desenvolvimento sustentado e os melhores de nós. Por isso quando descobrimos que há vinhos de Portalegre que são topo de gama ou quando descobrimos que há portalegrenses que são figura de referência nalgumas áreas ficamos admirados… Por incrível que possa parecer só na Polónia descobri que, na banda sonora do filme Amália, participa como guitarrista o nosso amigo António Eustáquio que grava com a Orquestra Sinfónica da Rádio de Budapeste. E o “Tói” é portalegrense, vive em Castelo de Vide e anda por aí… Muitas vezes somos levados a acreditar que Régio tinha razão quando escrevia “(…) Ora em Portalegre, não abundavam filósofos, moralistas ou psicólogos. Só abundava quem, por vacuidade interior e ausência de qualquer ocupação séria, continuamente vasculhasse na vida alheia” (in “Davam grandes passeios aos Domingos”). Temos de mostrar que Régio não tinha razão.
Jorge Luís Lourinho Mangerona