Luís Pargana
DESABAFOS - XIII
Abril
Estamos em Abril, mês de Primavera e de Revoluções!
Em Abril aconteceu a nossa Revolução, o 25 de Abril, corria o ano de 1974. Portugal acordou do seu sono letárgico, rejubilou de e abriu-se ao Mundo e à Esperança. Como é próprio das Revoluções, o País fez as suas rupturas, traçou caminhos, travou combates, fez aprendizagens e conquistas e foi construindo um caminho que consolidou a nossa liberdade e a democracia.
Este ano, comemoram-se 36 anos da Revolução portuguesa. Hoje poucos pensam no salto imenso que resultou da acção daquela madrugada de 74. Na revolução de valores que despontou dos canos das espingardas e dos punhos que então se ergueram um pouco por todo o lado. Nos direitos que se conquistaram – o direito a ter opinião e expressá-la, o direito a uma vida melhor, o direito à dignidade humana.
O País mudou!
Mas, Abril não resolveu todos os problemas do País, e muito menos do Mundo. Foi um passo no processo de desenvolvimento e de progresso, mas apenas um primeiro passo de um caminho longo e complexo que não cessa o seu percurso, enquanto durar a nossa existência colectiva.
36 anos depois da Revolução a democracia portuguesa está ainda longe de atingir a sua maturidade. É uma democracia jovem e cercada por tentações próprias do Mundo neo-liberalizado em que vivemos – tentações de poder, de enriquecimentos fáceis, tentações de egoísmo, individualismo e intolerância que contrariam os valores de igualdade, fraternidade e solidariedade proclamados em 25 de Abril de 74.
Uma das mais sólidas instituições resultantes da Revolução de Abril foi o Poder Local Democrático – as autarquias locais, Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia, eleitas pelas populações de 4 em 4 anos e que devem ser agentes de desenvolvimento local, próximos das populações e prestando contas directas das suas opções e actividades.
O sistema autárquico português é um exemplo de sucesso em toda a Europa, de administração municipal. No entanto, tem também os seus vícios e as excepções que confirmam a regra. Mas, que, pela proximidade que têm às populações acabam por ser um mau exemplo da forma de fazer política que em nada dignificam esta instituição de Abril.
Não falo de casos extremos e mediáticos, como são os exemplos de “Fátima Felgueiras”, “Isaltino Morais” ou de “Avelino Ferreira Torres”, que trouxeram para as autarquias o ónus da suspeição quanto à transparência das gestões municipais e da promiscuidade entre o interesse público e os interesses particulares, mas refiro-me a um dos maiores problemas dos nossos tempos, associado à inversão de valores que vai grassando pelo País – o chamado “chico-espertismo”, que faz com que sejam valorizadas práticas de desprezo para com as regras e as normas de boa conduta e convivência.
É este “chico-espertismo nacional” que está na génese dos desvios no exercício do poder no nosso País, nos problemas de corrupção e de controlo de pessoas e instituições que têm vindo a lume nos últimos tempos.
Mas, o problema começa nas famílias, quando o pai se gaba de não ter pago o pacote de gomas no supermercado, por distracção da rapariga da caixa, ou quando justifica a gazeta à escola, do seu filho, inventando um qualquer problema de saúde.
Continua na escola quando se banaliza a ideia de que copiar num exame só é errado quando se tem o azar de ser apanhado, ou de que não tem mal cometer falta sobre o adversário desde que o árbitro não veja.
Gabar-se de ter metido uma nota na carta de condução, para não se ser multado na estrada, ou de receber um subsídio indevido por falcatruar a declaração de IRS, são comportamentos recorrentes e que dizem muito do modo como nos relacionamos em sociedade e dos exemplos com que nos identificamos.
Voltando ao Poder Local Democrático, que resultou do 25 de Abril, sendo um dos mais importantes patamares da gestão pública no nosso País, é também um espelho do que de bom e de mau existe na nossa sociedade. Por isso, o exercício de um mandato autárquico, conferido pelo voto popular, deve ser entendido como uma responsabilidade acrescida de exemplo cívico e de cidadania.
É que Abril também tem o seu dia 1 e isso é um mal que afecta por vezes as instituições e os titulares de cargos públicos…
Por isso, não posso deixar de desabafar sobre a facilidade com que, por vezes, se mente no exercício destas funções, sem qualquer pudor em relação a essa mentira, por muito insignificante que possa parecer. Como, por exemplo, votar contra a acta, de uma reunião, alegando em declaração de voto que foi sonegada a possibilidade da sua leitura, quando a mesma foi fotocopiada, entregue, lida e corrigida nessa mesma reunião.
Quem mente por tão pouco é capaz de mentir por muito mais, desde que lhe sirva os propósitos e ainda que à custa da dignidade das pessoas. Enfim, trata-se, afinal, do tal “chico-espertismo” que o País tem de erradicar, porque lhe tolhe o desenvolvimento e a maturidade.
Em Abril, mês de revoluções, é tempo, também, para falarmos de valores. E para se mudarem comportamentos.
20/04/2010
Luís Pargana
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