Cartas Abertas
CARTAS ABERTAS
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O que faz Aristides no meio deles?
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Lisboa (ou lá onde for), 15 de Janeiro de 2007
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Minha Cara Maria Elisa
Minha Cara Maria Elisa
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Recebi do meu querido amigo Aristides de Sousa Mendes uma carta para si, pelo que a remeto imediatamente. Não sei se sabe, mas o Dr. Aristides é um homem ocupado (na verdade, e aqui entre nós, ele leva uma vida dupla entre o paraíso católico e o paraíso judaico, uma vez que, depois de ter falecido, foi admitido nos dois), razão pela qual não perde tempo a contactar com simples mortais. Eu sou um dos poucos eleitos, e daí que a carta me tenha chegado às mãos.
Desde já a aviso que o Dr. Aristides está um pouco incomodado com a situação que lhe foi criada. E, se bem o conheço, quando ele, do alto sua excelente educação se diz «um pouco incomodado» deve ser lido «chateado como o raio» ou mesmo «fulo», expressões que nunca usaria. E o seguinte o teor da sua carta.
‘«Dona Maria Elisa:
Soube de um programa de TV onde surjo como um dos 10 portugueses mais ilustres de sempre. Poderá Vexa pensar que isso me honra - e sentir-me-ia honrado, sem dúvida, acaso fossem outras as circunstâncias -, mas tal não acontece. Na verdade, nunca gostei de más companhias - não me pergunte quais, pois não é de meu timbre descer a tais pormenores. Compreenderá, no entanto, a quem (ou aos quais) me refiro.
Aceite os meus cumprimentos,
Aristides de Sousa Mendes.»
Na verdade, cara Maria Elisa, eu subscrevo inteiramente a carta do meu amigo Aristides. Que raio faz uma pessoa de bem no meio dessa gente eleita para bons e ilustres portugueses? Um homem que morreu na miséria por ter salvo a vida a milhares de pessoas que não conhecia e aos quais nada o ligava, que foi o altruísmo e o espírito de humanidade em pessoa, que tem a ver com os restantes nove?
Analisemos os restantes:
Um - o D. Afonso Henriques - não só bateu na mãe como mentiu com quantos dentes tem na boca ao seu Rei e primo Afonso VII, além de ter inventado este rectângulo em que vivemos. Em caso normal seriam seis anos de prisão maior. Outro, o D. João II, matou com as próprias mãos, à facada, o Duque de Viseu no próprio palácio real. O Marquês de Pombal imaginou uma conspiração para mandar matar os Távoras (pai e filho) e o Duque de Aveiro; do Salazar já se sabe - Tarrafal, Peniche Aljube, por aí fora há mortos e feridos. Do Cunhal foi falta de oportunidade, senão também havia de certeza.
E só aqui vão cinco. Vejam, agora, os outros quatro.
Um, o Infante D. Henrique, diz-se que era um homossexual reprimido; organizou a conquista de Tânger e deixou lá o irmão D. Fernando, tão preso e tão só que ficou conhecido como Infante Santo (o que prova que o D. Henrique não era Santo nenhum). Outro, o Vasco da Gama, ainda organizou umas repressõezinhas na Índia, quando foi, brevemente, em 1524, o segundo Vice-Rei daquelas terras, já depois de Afonso de Albuquerque ter andado a cortar narizes e pernas ao pessoal.
Por último, há dois poetas, o que podia safar a coisa. Mas um é semi-invisual (repare como eu não disse semi-óptico), o Camões; e o outro tem problemas de personalidade, o Pessoa.
Ora, e sublinho o que lhe diz o meu amigo Dr. Aristides, que raio faz ele no meio desta gente?
Aceite os meus cumprimentos
Recebi do meu querido amigo Aristides de Sousa Mendes uma carta para si, pelo que a remeto imediatamente. Não sei se sabe, mas o Dr. Aristides é um homem ocupado (na verdade, e aqui entre nós, ele leva uma vida dupla entre o paraíso católico e o paraíso judaico, uma vez que, depois de ter falecido, foi admitido nos dois), razão pela qual não perde tempo a contactar com simples mortais. Eu sou um dos poucos eleitos, e daí que a carta me tenha chegado às mãos.
Desde já a aviso que o Dr. Aristides está um pouco incomodado com a situação que lhe foi criada. E, se bem o conheço, quando ele, do alto sua excelente educação se diz «um pouco incomodado» deve ser lido «chateado como o raio» ou mesmo «fulo», expressões que nunca usaria. E o seguinte o teor da sua carta.
‘«Dona Maria Elisa:
Soube de um programa de TV onde surjo como um dos 10 portugueses mais ilustres de sempre. Poderá Vexa pensar que isso me honra - e sentir-me-ia honrado, sem dúvida, acaso fossem outras as circunstâncias -, mas tal não acontece. Na verdade, nunca gostei de más companhias - não me pergunte quais, pois não é de meu timbre descer a tais pormenores. Compreenderá, no entanto, a quem (ou aos quais) me refiro.
Aceite os meus cumprimentos,
Aristides de Sousa Mendes.»
Na verdade, cara Maria Elisa, eu subscrevo inteiramente a carta do meu amigo Aristides. Que raio faz uma pessoa de bem no meio dessa gente eleita para bons e ilustres portugueses? Um homem que morreu na miséria por ter salvo a vida a milhares de pessoas que não conhecia e aos quais nada o ligava, que foi o altruísmo e o espírito de humanidade em pessoa, que tem a ver com os restantes nove?
Analisemos os restantes:
Um - o D. Afonso Henriques - não só bateu na mãe como mentiu com quantos dentes tem na boca ao seu Rei e primo Afonso VII, além de ter inventado este rectângulo em que vivemos. Em caso normal seriam seis anos de prisão maior. Outro, o D. João II, matou com as próprias mãos, à facada, o Duque de Viseu no próprio palácio real. O Marquês de Pombal imaginou uma conspiração para mandar matar os Távoras (pai e filho) e o Duque de Aveiro; do Salazar já se sabe - Tarrafal, Peniche Aljube, por aí fora há mortos e feridos. Do Cunhal foi falta de oportunidade, senão também havia de certeza.
E só aqui vão cinco. Vejam, agora, os outros quatro.
Um, o Infante D. Henrique, diz-se que era um homossexual reprimido; organizou a conquista de Tânger e deixou lá o irmão D. Fernando, tão preso e tão só que ficou conhecido como Infante Santo (o que prova que o D. Henrique não era Santo nenhum). Outro, o Vasco da Gama, ainda organizou umas repressõezinhas na Índia, quando foi, brevemente, em 1524, o segundo Vice-Rei daquelas terras, já depois de Afonso de Albuquerque ter andado a cortar narizes e pernas ao pessoal.
Por último, há dois poetas, o que podia safar a coisa. Mas um é semi-invisual (repare como eu não disse semi-óptico), o Camões; e o outro tem problemas de personalidade, o Pessoa.
Ora, e sublinho o que lhe diz o meu amigo Dr. Aristides, que raio faz ele no meio desta gente?
Aceite os meus cumprimentos
Comendador Marques de Correia
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Que raio faz uma pessoa de bem no meio dessa gente?
in, ÚNICA 20 Janeiro 2007 Expresso p. 98
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