Olivença é Portugal
Semanário "O SOL", 23-DEZEMBRO-2006 (OLIVENÇA!)
"OLIVENÇA LUTOU EM 1640-1668!"
Li, com muita atenção, como é lógico, a carta de Theresa Schedel de Castello Branco, de Lisboa, no "Sol" de 16 de Dezembro de 2006, sob o título "Olivença agradecerá o esforço?"
Não sei o que me impressionou mais. Talvez a incapacidade da autora em compreender que há quem lute por causas apenas por as considerar justas, mesmo quando parecem "perdidas". Nem ouso especular sobre o que terá pensado esta senhora sobre os quixotescos que acreditaram, nas décadas de 80 e 90, que ainda valia a pena acreditar num Timor Livre.
Também não vou entrar em pormenores sobre o "quixotismo", no qual há um aspecto que me apaixona: o Cavaleiro da Triste Figura lutava obstinadamente pelos seus ideais, a maioria dos quais bem generosos. Para mim, prefiro-o aos seus adversários, frios, calculistas, interesseiros.
O que eu não perdoo (enfim, é uma maneira de dizer...) é o desconhecimento Histórico. A autora, de entre os documentos da época de 1640-1668, escolheu um dos mais pessimistas, quando poderia ter optado por muitos outros com outras opiniões. Desconhece dois casos que deveriam ser um exemplo: em 1641, a 17 de Setembro, ante um ataque surpresa de espanhóis, os populares oliventinos, enquanto esperavam tropas regulares, defenderam a sua terra com sacrifício das vidas de muitos de entre eles, junto à Porta do Calvário, o que deu origem a que o feriado municipal, até 1801, fosse celebrado a 17 de Setembro (onde estavam então as ligações a "Castela", matrimoniais e outras?); o outro caso, mais significativo, ocorre em 1657/8, quando as tropas espanholas se apoderaram de Olivença, e os seus seis mil habitantes, salvo 30, não aceitaram as propostas do ocupante, e abandonaram a povoação, dispersando-se por Elvas, Juromenha, Estremoz, Vila Viçosa, Alandroal, etc. Só regressaram a Olivença com a Paz de 1668 e a reentrega de Olivença a Portugal. Entretanto, espanhóis de Cheles, Alconchel, e Badajoz, tinham ido para a Terra das Oliveiras, principalmente para fazer uma recepção entusiástica ao Rei de Espanha... uma farsa abominável!
O facto (o exílio auto-imposto dos oliventinos) foi bastante comentado, mesmo por toda a Europa. Fontes francesas, inglesas, e alemãs, apontam estes acontecimentos como demonstrativos da fidelidade de um povo ao seu rei (Afonso VI, então). (...)
Carlos Eduardo da Cruz Luna
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"OLIVENÇA LUTOU EM 1640-1668!"
Li, com muita atenção, como é lógico, a carta de Theresa Schedel de Castello Branco, de Lisboa, no "Sol" de 16 de Dezembro de 2006, sob o título "Olivença agradecerá o esforço?"
Não sei o que me impressionou mais. Talvez a incapacidade da autora em compreender que há quem lute por causas apenas por as considerar justas, mesmo quando parecem "perdidas". Nem ouso especular sobre o que terá pensado esta senhora sobre os quixotescos que acreditaram, nas décadas de 80 e 90, que ainda valia a pena acreditar num Timor Livre.
Também não vou entrar em pormenores sobre o "quixotismo", no qual há um aspecto que me apaixona: o Cavaleiro da Triste Figura lutava obstinadamente pelos seus ideais, a maioria dos quais bem generosos. Para mim, prefiro-o aos seus adversários, frios, calculistas, interesseiros.
O que eu não perdoo (enfim, é uma maneira de dizer...) é o desconhecimento Histórico. A autora, de entre os documentos da época de 1640-1668, escolheu um dos mais pessimistas, quando poderia ter optado por muitos outros com outras opiniões. Desconhece dois casos que deveriam ser um exemplo: em 1641, a 17 de Setembro, ante um ataque surpresa de espanhóis, os populares oliventinos, enquanto esperavam tropas regulares, defenderam a sua terra com sacrifício das vidas de muitos de entre eles, junto à Porta do Calvário, o que deu origem a que o feriado municipal, até 1801, fosse celebrado a 17 de Setembro (onde estavam então as ligações a "Castela", matrimoniais e outras?); o outro caso, mais significativo, ocorre em 1657/8, quando as tropas espanholas se apoderaram de Olivença, e os seus seis mil habitantes, salvo 30, não aceitaram as propostas do ocupante, e abandonaram a povoação, dispersando-se por Elvas, Juromenha, Estremoz, Vila Viçosa, Alandroal, etc. Só regressaram a Olivença com a Paz de 1668 e a reentrega de Olivença a Portugal. Entretanto, espanhóis de Cheles, Alconchel, e Badajoz, tinham ido para a Terra das Oliveiras, principalmente para fazer uma recepção entusiástica ao Rei de Espanha... uma farsa abominável!
O facto (o exílio auto-imposto dos oliventinos) foi bastante comentado, mesmo por toda a Europa. Fontes francesas, inglesas, e alemãs, apontam estes acontecimentos como demonstrativos da fidelidade de um povo ao seu rei (Afonso VI, então). (...)
Carlos Eduardo da Cruz Luna
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A CARTA DA SENHORA (16 de Dezembro de 2006)
OLIVENÇA AGRADECERÁ O ESFORÇO?
CONCORDO com Marcelo Rebelo de Sousa, na sua coluna no "SOL", que é de admirar o esforço de Carlos Luna em prol de Olivença. Mas parece-me ligeiramente quixotesco. Será que os habitantes de Olivença lhe agradecem o esforço?
Em 1640, quando foram libertados do jugo espanhol, acolheram a coisa com pouco entusiasmo. Francisco de Melo Torres (futuro Conde da Ponte e Marquês de Sande), recém-nomeado governador da Praça, lamentava, a 5 de Março de 1641, em carta para D. João IV, a atitude pouco patriótica da população.
A gente da terra tinha muita comunicação com o lado espanhol, quase não havia um morador que não fosse casado com uma castelhana, ou filho de castelhana. Os mais ricos, os mais disponíveis para servir, tinham gado, dinheiro, seara, em terra espanhola. A gente não se prestava ao serviço de Sua Majestade como devia, "havendo entre eles um modo de linguagem, que em suma é que com o que sofrem ao perder a comunicação com Espanha, já fizeram serviço de sobra a Vossa Majestade".
Quando Francisco de Melo Torres quer alojar os soldados que vieram com ele, o povo faz reclamações, quando faz um alarde para o treino da guarnição, ninguém aparece, há pelo menos quarenta cavalos na vila, mas quando convocou os donos com os seus animais só onze se apresentaram. E conclui: "Afirmo a Vossa Majestade, com a verdade que devo falar, que é uma lástima o que nesta vila se vê. Todos estes senhores se acham potentados livres e eu escusado na sua assistência. Todos cuidam que deram o reino a Vossa Majestade e que em Olivença consiste".
Vale a pena, então, repetir a pergunta: Será que os habitantes de Olivença agradecem o esforço?
Theresa Schedel de Castello Branco - LISBOA
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OLIVENÇA AGRADECERÁ O ESFORÇO?
CONCORDO com Marcelo Rebelo de Sousa, na sua coluna no "SOL", que é de admirar o esforço de Carlos Luna em prol de Olivença. Mas parece-me ligeiramente quixotesco. Será que os habitantes de Olivença lhe agradecem o esforço?
Em 1640, quando foram libertados do jugo espanhol, acolheram a coisa com pouco entusiasmo. Francisco de Melo Torres (futuro Conde da Ponte e Marquês de Sande), recém-nomeado governador da Praça, lamentava, a 5 de Março de 1641, em carta para D. João IV, a atitude pouco patriótica da população.
A gente da terra tinha muita comunicação com o lado espanhol, quase não havia um morador que não fosse casado com uma castelhana, ou filho de castelhana. Os mais ricos, os mais disponíveis para servir, tinham gado, dinheiro, seara, em terra espanhola. A gente não se prestava ao serviço de Sua Majestade como devia, "havendo entre eles um modo de linguagem, que em suma é que com o que sofrem ao perder a comunicação com Espanha, já fizeram serviço de sobra a Vossa Majestade".
Quando Francisco de Melo Torres quer alojar os soldados que vieram com ele, o povo faz reclamações, quando faz um alarde para o treino da guarnição, ninguém aparece, há pelo menos quarenta cavalos na vila, mas quando convocou os donos com os seus animais só onze se apresentaram. E conclui: "Afirmo a Vossa Majestade, com a verdade que devo falar, que é uma lástima o que nesta vila se vê. Todos estes senhores se acham potentados livres e eu escusado na sua assistência. Todos cuidam que deram o reino a Vossa Majestade e que em Olivença consiste".
Vale a pena, então, repetir a pergunta: Será que os habitantes de Olivença agradecem o esforço?
Theresa Schedel de Castello Branco - LISBOA
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MINHA RESPOSTA, NO ORIGINAL, TINHA MAIS UM PARÁGRAFO NO FIM!:
(...)" O facto (o exílio auto-imposto dos oliventinos) foi bastante comentado, mesmo por toda a Europa. Fontes francesas, inglesas, e alemãs, apontam estes acontecimentos como demonstrativos da fidelidade de um povo ao seu rei (Afonso VI, então).
Um frade jesuíta compôs mesmo uma poesia em Latim, que reproduzo (seguindo-se a tradução):
(...)" O facto (o exílio auto-imposto dos oliventinos) foi bastante comentado, mesmo por toda a Europa. Fontes francesas, inglesas, e alemãs, apontam estes acontecimentos como demonstrativos da fidelidade de um povo ao seu rei (Afonso VI, então).
Um frade jesuíta compôs mesmo uma poesia em Latim, que reproduzo (seguindo-se a tradução):
.
DE URBE OLIVENTIA CAPTA
"Quas tibi Palladias, Alfonse, Philippus olivas
abstulit incolumes has tibi Pallas alit.
Perfidae et fidei certatum est robore,portas
perfidia intravit, corda fides tenuit.
Omnibus in patria manendi est facta potestas:
nullum captivum mansit in orbe caput.
Victrices Aquilas defixit in arce Philipus;
Lusiadum, Alfonse, in pectore fixus ades.
Victor uterque fuit, victoria dividit urbem:
Alfonsus cives; saxa Philippus habet."
.
Tradução:
A TOMADA DA CIDADE (VILA) DE OLIVENÇA
"As oliveiras de Palas, Afonso, que Filipe te arrebatou,
guarda-as Palas para ti, intactas.
Combateu-se com as forças da traição e da lealdade:
a traição cruzou as portas, mas a lealdade manteve os corações fiéis.
A todos se lhes deu a possibilidade de ficar na pátria (cidade, vila),
mas nenhum permaneceu cativo no recinto urbano.
Filipe cravou no torreão as suas águias vitoriosas;
mas tu, Afonso (IV), estás cravado no peito dos portugueses.
Cada um ficou vencedor, a vitória fez a divisão da cidade:
Afonso obtém os cidadãos, Filipe os muros de pedra."
.
Curioso, não é? Veja-se como a verdade histórica contraria a lógica da D. Theresa Castello Branco!
Acredito que a autora não tivesse má intenção. Na verdade, há tanta desinformação sobre o tema Olivença, em Portugal, que é vulgar surgirem textos deste teor.
Claro, em Espanha (e Olivença) é pior. O oliventino quase nada sabe sobre a sua História, o que é lamentável, principalmente numa democracia.
Só para dar um exemplo: Olivença perdeu gente e importância no século XIX (nos primeiros 100 anos de administração espanhola). Em 1801, segundo a "História da Extremadura" (de Maecelino Cardalliaguet, 1993, Bibl. Pop Extrem., Badajoz), Olivença era tão grande com, por exemplo, Badajoz (!!!). Era tão grande como uma cidade como Estremoz. Hoje, tem 11 000 Habitantes, enquanto Estremoz tem 16 000.
Espero ter contribuído para, de alguma forma, esclarecer os leitores do "Sol" e a autora da carta de 16-Dezembro-2006 ao mesmo.
DE URBE OLIVENTIA CAPTA
"Quas tibi Palladias, Alfonse, Philippus olivas
abstulit incolumes has tibi Pallas alit.
Perfidae et fidei certatum est robore,portas
perfidia intravit, corda fides tenuit.
Omnibus in patria manendi est facta potestas:
nullum captivum mansit in orbe caput.
Victrices Aquilas defixit in arce Philipus;
Lusiadum, Alfonse, in pectore fixus ades.
Victor uterque fuit, victoria dividit urbem:
Alfonsus cives; saxa Philippus habet."
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Tradução:
A TOMADA DA CIDADE (VILA) DE OLIVENÇA
"As oliveiras de Palas, Afonso, que Filipe te arrebatou,
guarda-as Palas para ti, intactas.
Combateu-se com as forças da traição e da lealdade:
a traição cruzou as portas, mas a lealdade manteve os corações fiéis.
A todos se lhes deu a possibilidade de ficar na pátria (cidade, vila),
mas nenhum permaneceu cativo no recinto urbano.
Filipe cravou no torreão as suas águias vitoriosas;
mas tu, Afonso (IV), estás cravado no peito dos portugueses.
Cada um ficou vencedor, a vitória fez a divisão da cidade:
Afonso obtém os cidadãos, Filipe os muros de pedra."
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Curioso, não é? Veja-se como a verdade histórica contraria a lógica da D. Theresa Castello Branco!
Acredito que a autora não tivesse má intenção. Na verdade, há tanta desinformação sobre o tema Olivença, em Portugal, que é vulgar surgirem textos deste teor.
Claro, em Espanha (e Olivença) é pior. O oliventino quase nada sabe sobre a sua História, o que é lamentável, principalmente numa democracia.
Só para dar um exemplo: Olivença perdeu gente e importância no século XIX (nos primeiros 100 anos de administração espanhola). Em 1801, segundo a "História da Extremadura" (de Maecelino Cardalliaguet, 1993, Bibl. Pop Extrem., Badajoz), Olivença era tão grande com, por exemplo, Badajoz (!!!). Era tão grande como uma cidade como Estremoz. Hoje, tem 11 000 Habitantes, enquanto Estremoz tem 16 000.
Espero ter contribuído para, de alguma forma, esclarecer os leitores do "Sol" e a autora da carta de 16-Dezembro-2006 ao mesmo.
Carlos Eduardo da Cruz Luna
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Recebido via mail. [mj]
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