A Filosofia da Saudade
Opinião
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A filosofia da saudade
A filosofia da saudade
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«A pauta do calendário refere que Braz Teixeira completou, neste ano de 2006, o 70. ° aniversário de vida, data jubilar para uma pessoa que tem sido, mais do que um nome, uma obra, iniciada de modo consistente em 1959 — quase meio século — com um estudo ainda hoje referendado como valiosa abordagem ao pensamento jurídico português na actualidade do tempo em que esse estudo foi publicado»
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PINHARANDA GOMES
«A pauta do calendário refere que Braz Teixeira completou, neste ano de 2006, o 70. ° aniversário de vida, data jubilar para uma pessoa que tem sido, mais do que um nome, uma obra, iniciada de modo consistente em 1959 — quase meio século — com um estudo ainda hoje referendado como valiosa abordagem ao pensamento jurídico português na actualidade do tempo em que esse estudo foi publicado»
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PINHARANDA GOMES
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EMBORA o título desta crónica seja outro, tomamos para inicial sujeito dela o nome de António Braz Teixeira, que geralmente é apresentado como professor, pensador e ensaísta, com prejuízo do seu genuíno carisma, que é o de filósofo, ave cada vez mais rara no tecido cultural português e, não sabemos ao certo, de muitas outras partes do mundo. A pauta do calendário refere que Braz Teixeira completou, neste ano de 2006, o 70.° aniversário de vida, data jubilar para uma pessoa que tem sido, mais do que um nome, uma obra, iniciada de modo consistente em 1959 — quase meio século — com um estudo ainda hoje referendado como valiosa abordagem ao pensamento jurídico português na actualidade do tempo em que esse estudo foi publicado.
Para além da obra própria, investiu Braz Teixeira muito tempo e muito saber no serviço do outro, quer em estudos de exegese e de hermenêutica das mais singularesreferências do nosso pensamento filosófico (nosso: brasileiro, galego, português) querem tratamento editorial de textos de vários autores, sobretudo na área da filosofia jurídica. Depois de Cabral de Moncada, há uns bons anos falecido, parece não haver umpensador tão presente nessa tão interpelante disciplina que envolve os problemas ontológicos e ético-políticos do Direito e da Justiça.
Todos quantos, cada um a seu modo, vivemos a grande e questionada aventuraque foi (ou ainda é?) o movimento da «Filosofia Portuguesa», temos excelentes motivos para nos engalanarmos com o nome de Braz Teixeira, porque ele foi, e temsido, militante comprometido e exemplo de perseverança, inclusivamente abrindo à «Filosofia Portuguesa» a consideração de instituições que Álvaro Ribeiro e José Marinho julgavam inelutavelmente fechadas ao ideário de que foram inventores e missionários.
EMBORA o título desta crónica seja outro, tomamos para inicial sujeito dela o nome de António Braz Teixeira, que geralmente é apresentado como professor, pensador e ensaísta, com prejuízo do seu genuíno carisma, que é o de filósofo, ave cada vez mais rara no tecido cultural português e, não sabemos ao certo, de muitas outras partes do mundo. A pauta do calendário refere que Braz Teixeira completou, neste ano de 2006, o 70.° aniversário de vida, data jubilar para uma pessoa que tem sido, mais do que um nome, uma obra, iniciada de modo consistente em 1959 — quase meio século — com um estudo ainda hoje referendado como valiosa abordagem ao pensamento jurídico português na actualidade do tempo em que esse estudo foi publicado.
Para além da obra própria, investiu Braz Teixeira muito tempo e muito saber no serviço do outro, quer em estudos de exegese e de hermenêutica das mais singularesreferências do nosso pensamento filosófico (nosso: brasileiro, galego, português) querem tratamento editorial de textos de vários autores, sobretudo na área da filosofia jurídica. Depois de Cabral de Moncada, há uns bons anos falecido, parece não haver umpensador tão presente nessa tão interpelante disciplina que envolve os problemas ontológicos e ético-políticos do Direito e da Justiça.
Todos quantos, cada um a seu modo, vivemos a grande e questionada aventuraque foi (ou ainda é?) o movimento da «Filosofia Portuguesa», temos excelentes motivos para nos engalanarmos com o nome de Braz Teixeira, porque ele foi, e temsido, militante comprometido e exemplo de perseverança, inclusivamente abrindo à «Filosofia Portuguesa» a consideração de instituições que Álvaro Ribeiro e José Marinho julgavam inelutavelmente fechadas ao ideário de que foram inventores e missionários.
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Chave interrogativa
Dois volumes novos ficam desde já a atestar o jubileu: «Diálogos e Perfis» (estudos sobre o Pensamento Português e Luso-Brasileiro) e «A Filosofia da Saudade». Quanto ao primeiro, apenas a breve informação de que o volume se espraia eu duas partes (a primeira sobre convergências e divergências dos pensamentos brasileiro e português. A segunda, um leque variado de ensaios intemporais sobre o pensamento de personalidades como Suárez, Álvaro, Marinho, Orlando Vitorino e, porque não, António Sérgio, recebendo este uma outra luz que não a da estafada obscuridade das ideologias).
A Saudade (sentimento ou filosofema seja) é tema/problema que emerge no contexto da obra escrita por Braz Teixeira. Emergência frequente na busca de uma sistematização teorética, na coincidência de que, não obstante as antíteses (algumas vezes resumidas a meras opiniões mal humoradas) a saudade constitui matéria digna de reflexão filosófica, tanto nas vertentes antropológica e etnológica como nas vertentes da Psicologia, da Metafísica e da Teodiceia, para já não dizermos da Teologia (e da Mariologia, pois há a invocação portuguesa de Nossa Senhora da Saudade, bem diversa da castelhana Soledad).
Este livro, «A Filosofia da Saudade» (Quidnovi, 2006) deve ser recebido como um tratado em espécie, e não apenas de generalidades, do tema da saudade, em cujo átrio votivo o autor coloca os nomes dos principais representantes, já falecidos, da doutrina saudosista, deles nos cabendo salientar os nomes de cavaleiros andantes como o Padre Dias de Magalhães e Afonso Botelho.
Texto de natureza histórico-filosófica, abre com um subsistente discurso acerca da Saudade, dos respectivos ciclos doutrinais, que encerra com a exposição da problemática filosófica. Chave interrogativa: «Que contribuição original pode ela (a saudade) trazer à solução do problema do mal, ao problema da liberdade e ao problema da imortalidade pessoal?» - Teorema bem mais complexo do que o teor das ideias feitas, ou opiniões subjectivas. Na exposição propriamente dita há três capítulos densos. O primeiro acerca da Filosofia Portuguesa da Saudade, com identificação e exposição das teses dos fundadores dessa Filosofia, - (arcano: D. Duarte) e, a partir deles, os teorizadores da modernidade, com relevo para os nomes da «Renascença Portuguesa» e respectivas sucessões, desde Teixeira de Pascoaes às gerações posteriores; incluindo as mais novas. Do mesmo capítulo faz parte a contrastação das antíteses ou das paráfrases assumidas por pensadores geralmente tidos e havidos como não-saudosistas, com os específicos contributos da consciência saudosa de Joaquim de Carvalho, e dos dois Ferreira, João e Vergílio.
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Chave interrogativa
Dois volumes novos ficam desde já a atestar o jubileu: «Diálogos e Perfis» (estudos sobre o Pensamento Português e Luso-Brasileiro) e «A Filosofia da Saudade». Quanto ao primeiro, apenas a breve informação de que o volume se espraia eu duas partes (a primeira sobre convergências e divergências dos pensamentos brasileiro e português. A segunda, um leque variado de ensaios intemporais sobre o pensamento de personalidades como Suárez, Álvaro, Marinho, Orlando Vitorino e, porque não, António Sérgio, recebendo este uma outra luz que não a da estafada obscuridade das ideologias).
A Saudade (sentimento ou filosofema seja) é tema/problema que emerge no contexto da obra escrita por Braz Teixeira. Emergência frequente na busca de uma sistematização teorética, na coincidência de que, não obstante as antíteses (algumas vezes resumidas a meras opiniões mal humoradas) a saudade constitui matéria digna de reflexão filosófica, tanto nas vertentes antropológica e etnológica como nas vertentes da Psicologia, da Metafísica e da Teodiceia, para já não dizermos da Teologia (e da Mariologia, pois há a invocação portuguesa de Nossa Senhora da Saudade, bem diversa da castelhana Soledad).
Este livro, «A Filosofia da Saudade» (Quidnovi, 2006) deve ser recebido como um tratado em espécie, e não apenas de generalidades, do tema da saudade, em cujo átrio votivo o autor coloca os nomes dos principais representantes, já falecidos, da doutrina saudosista, deles nos cabendo salientar os nomes de cavaleiros andantes como o Padre Dias de Magalhães e Afonso Botelho.
Texto de natureza histórico-filosófica, abre com um subsistente discurso acerca da Saudade, dos respectivos ciclos doutrinais, que encerra com a exposição da problemática filosófica. Chave interrogativa: «Que contribuição original pode ela (a saudade) trazer à solução do problema do mal, ao problema da liberdade e ao problema da imortalidade pessoal?» - Teorema bem mais complexo do que o teor das ideias feitas, ou opiniões subjectivas. Na exposição propriamente dita há três capítulos densos. O primeiro acerca da Filosofia Portuguesa da Saudade, com identificação e exposição das teses dos fundadores dessa Filosofia, - (arcano: D. Duarte) e, a partir deles, os teorizadores da modernidade, com relevo para os nomes da «Renascença Portuguesa» e respectivas sucessões, desde Teixeira de Pascoaes às gerações posteriores; incluindo as mais novas. Do mesmo capítulo faz parte a contrastação das antíteses ou das paráfrases assumidas por pensadores geralmente tidos e havidos como não-saudosistas, com os específicos contributos da consciência saudosa de Joaquim de Carvalho, e dos dois Ferreira, João e Vergílio.
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Parabéns a Braz Teixeira
O segundo capítulo ordena os perfis do saudosismo galego, desde o mais antigo, Cabanillas, Otero Pedrayo e Ramón Pinheiro, a outros mais recentes. Exercício análogo Braz Teixeira aplica ao caso do Brasil, singularidade na obra de Miguel Reale. Por fim, uma breve digressão por Angola e por Ortega y Gasset, como que em forma de escólio, apresentando a prova de que a Saudade está em expansão e de que ela terá a viçosidade que, esperamos, a cultura lusíada também terá, nas mais remotas partes do mundo e nas mais escondidas almas de quem pense em língua portuguesa.
Esclarecedor, o livro em vista é também provocador. De facto, optando por uma liberalidade reflexiva, o autor não fecha as portas à continuidade da interrogativa de onde todo o pensamento sobressalta: que é Saudade?
Uma ontologia, uma teleologia, o distante que se toma próximo, o ausente que se torna presente e, ao fim do tempo, o reencontro da natureza humana com a natureza que algum dia pode efectivamente ter perdido. O veio messiânico passa, em toda a parte, pelas ondas marinhas da saudade, coração da Lusitânia, entidade muito distinta desse corpo que é a Ibéria.
Parabéns a Braz Teixeira e aos seus leitores.
O segundo capítulo ordena os perfis do saudosismo galego, desde o mais antigo, Cabanillas, Otero Pedrayo e Ramón Pinheiro, a outros mais recentes. Exercício análogo Braz Teixeira aplica ao caso do Brasil, singularidade na obra de Miguel Reale. Por fim, uma breve digressão por Angola e por Ortega y Gasset, como que em forma de escólio, apresentando a prova de que a Saudade está em expansão e de que ela terá a viçosidade que, esperamos, a cultura lusíada também terá, nas mais remotas partes do mundo e nas mais escondidas almas de quem pense em língua portuguesa.
Esclarecedor, o livro em vista é também provocador. De facto, optando por uma liberalidade reflexiva, o autor não fecha as portas à continuidade da interrogativa de onde todo o pensamento sobressalta: que é Saudade?
Uma ontologia, uma teleologia, o distante que se toma próximo, o ausente que se torna presente e, ao fim do tempo, o reencontro da natureza humana com a natureza que algum dia pode efectivamente ter perdido. O veio messiânico passa, em toda a parte, pelas ondas marinhas da saudade, coração da Lusitânia, entidade muito distinta desse corpo que é a Ibéria.
Parabéns a Braz Teixeira e aos seus leitores.
in, O DIABO, 19/12/2006, p. 21
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