O 'estruturas'
O ‘estruturas’
Em todas as terras e lugares houve caciques e candidatos a
caciques. Geralmente gente que se impunha não pela inteligência mas sim pela
força, que eram temidos, bajulados quanto tinham o poder mas simultaneamente
odiados. E quando acontecia a sua queda, até os cães lhes ladravam à sua
passagem.
Os partidos políticos, principalmente os de origem popular,
sempre foram geradores de caciques e caciquismo. Que o diga o PPD-PSD, o
partido que a Terceira República pariu dos restos do Estado Novo Caetanista, na
sua versão dita liberal, mas que mais não era de que um grupo de luminárias da
pequena burguesia que através da política aspirava a lugares na sociedade e
principalmente nos negócios que de outra forma lhes seriam negados. Para eles a
ascensão social era o objectivo, pelo que não tinham ideologia e cultivavam um
catolicismo de paróquia.
Os deuses foram-lhes favoráveis, e com o aproveitamento do
aparelho caciquista do Estado Novo Caetanista, consubstanciado na ANP (Acção
Nacional Popular), conseguiram na província excelentes resultados eleitorais,
que o transformaram no segundo maior partido.
Estava-se em 1974, 75 e 76. E é aqui que aparece pela
primeira vez o ‘estruturas’.
Ainda hoje não sabemos o seu nome de baptismo, embora
saibamos que Simão é um dos seus nomes ou apelidos. Também não o vemos há
tempo. Pensamos que estando ainda vivo, terá enviuvado. Mas recorrendo às
últimas vezes que o vimos, era um homem alquebrado, triste, e nitidamente só.
Há um momento que nunca esquecemos e que terá sido a
primeira vez que o teremos visto. Havia comício do PPD no Pavilhão
Gimnodesportivo com o líder. O ‘estruturas’ destaca-se pela altura e pelo
vozeirão. Tinha um cajado e ladeava Sá Carneiro em pose de segurança privado.
Era ridículo o ‘estruturas’! A sua agressividade verbal, a
par do manuseamento do cajado, fazia daquele momento um acto de pura fealdade,
mas do agrado popular, que não só o apoiava como o incitava a maior verborreia.
Mais tarde encontrámos o ‘estruturas’ no Café Facha, de boa
memória porque ainda conservava a patine dos seus melhores tempos.
Era aqui, quando vinha à cidade, que fazia os seus discursos
políticos, muito ao estilo caciquista e caciqueiro do PPD, e onde tinha uma
pequena plateia atenta à sua fanforronice, e grosseria quando contrariado.
Como ia às sessões de esclarecimento do PPD de Portalegre,
onde a cultura política estava ao nível da falta de cultura cívica, conseguiu
captar umas ideias que se traduziam numas famosas ‘estruturas’, estruturas
essas que ele nunca conseguiu explicar o que eram ou seriam.
Desta forma, nos seus comícios no Café Facha, falava e
tornava a falar de ‘estruturas’, ficando a partir de então a ser conhecido pelo
‘estruturas’. Abençoados os pobres de espírito, lê-se no Sermão da Montanha.
Lá pregou ‘estruturas’ durante anos em nome do PPD, depois
PSD, mas nunca conseguiu alcançar lugares de relevo dentro do partido, e muito
menos lugares de nomeação política. De desgosto em desgosto, lá foi sempre
lutando pelo grande objectivo da sua luta e carreira política, que era ser
presidente da junta de freguesia da sua terra, a antiga figura do regedor.
Para vir a ser candidato ao tão desejado lugar teve que
abjurar o seu credo PPD-PSD e ir concorrer nas listas do CDS, nas quais foi
notoriamente derrotado. Há vezes em que o crime não compensa.
Ainda o ouvimos discursar na defesa do CDS, mas já sem a
forma abrutalhada de falar que o caracterizara. No CDS sempre havia outro
polimento!
Curiosamente, naquele mesmo tempo outra ‘figura’
prontificava no Café Facha. Este, o Vitório, era do CDS, e fazia comícios para
a mesma audiência do ‘estruturas’. Falava tanto e de tanta coisa, que passou a
ser conhecido por ‘fala-barato’.
Zangado pelo CDS não ser maior que o PPD, mudou de partido e
passou a propagandear o PPD. Mas a vida pregou-lhe uma partida, e partiu ainda
muito novo. Que a sua Alma descanse em Paz.
O Vitório não era agressivo e de “maus-figados” como o
‘estruturas’. Homem bom deixou saudades. O ‘estruturas’ quis “dar o passo maior
que a perna”, e sofreu com isso.
Hoje, em Portalegre, poucos recordarão o Vitório, e menos o
‘estruturas’. Ambos foram protagonistas de uma farsa, que era a política local
numa terra que começava a definhar por força da medíocre classe política que
parira com o 25 de Abril de 1974.
Mário Casa Nova Martins
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