\ A VOZ PORTALEGRENSE: «Novembro» de Jaime Nogueira Pinto

quarta-feira, dezembro 05, 2012

«Novembro» de Jaime Nogueira Pinto

Novembro é um mês cinzento, já a meio do outono. Os dias são curtos, as noites longas, o frio está a chegar, bem como a chuva. As árvores começam a despedir-se das suas folhas, há muito que o verde deu lugar aos castanhos, que as aves se foram para sul e os animais ou hibernam ou se aconchegam uns com os outros. Novembro é um mês triste!
É em Novembro de 1975 que termina o livro de Jaime Nogueira Pinto, com o mesmo nome. «Novembro» não é um romance histórico, como os de Alexandre Herculano ou Rebello da Silva, também não é um romance como os de Camilo Castelo Branco ou Agustina Bessa-Luiz, nem é um livro de História como os de Joaquim Veríssimo Serrão ou Rui Ramos. «Novembro» de Jaime Nogueira Pinto é um pouco de tudo e de todos. Não será a sua autobiografia, embora na obra ele surja como um dos protagonistas. Também não é a história do namoro da sua vida, mas é como se fosse. Mas é a história de um período da História de Portugal, entre 1973 e 1975, tempos de final de Regime e tempos de Revolução, por ele vivida e sentida.
Jaime Nogueira Pinto é mais um anti-herói, que herói em «Novembro». Mas coloca-se no inner circle da trama. E entrega os papéis de herói e heroína a terceiros, por quem é nítida uma paixão, que não uma inveja.
Eduardo e Diana são para Alexandre tudo o que gostaria de ser e que se resumia em ser filho-família, ele que é órfão e a viver com a mãe, no fundo levando uma vida modesta como na época vivia a pequena burguesia. Alexandre vive com complexos de inferioridade social, ele que nunca chumbara, que lia tudo e via tudo no cinema. Mas ao longo do tempo vai entrando na intimidade da família de Eduardo, chegando a conhecer e a apaixonar-se pela irmã. Os amores entre Diana e Eduardo são de início clandestinos, e é um desastre de guerra que vai permitir que passem a públicos. Amores, traições, homossexualidade, apimentam a vida dos adultos, a começar pela do adulto-mor e figura central do enredo, e simultaneamente pai de Inha e Eduardo.
Se esta é a parte do romance, a parte da história é o tempo que antecede a Revolução do 25 de Abril de 1974, até ao fim do Verão Quente. Por todo o livro é fácil identificar as personagens, os fatos são narrados ‘visto de Direita’.
De centuriões a pretorianos, do Marcellismo à corporativista Revolução dos Cravos, a chegada dos mercenários a soldo de uma ideologia de Extrema-Esquerda que vai colapsar em 25 de Novembro de 1975, eis a história contada por quem estava do seu ‘lado errado’!
Alexandre pertencia a uma Extrema-Direita não-Marcellista, defensora do Ultramar e de Verdades que assimilara das leituras que fizera e dos filmes que vira. Ideólogo e publicista, quer ascensão social, e encontra no amor uma possível forma de a alcançar. Nos acontecimentos é mais espetador que interveniente. O seu mundo alarga-se com a ida, fuga para Espanha, para Madrid. É Eduardo quem vai para o Ultramar, para Angola, onde assiste ao estertor do Regime, onde participa na contra-revolução, onde é preso, e de onde regressa sem sonhos, que não o de e por Diana.
«Novembro» foi lido com carinho e raiva. Primeiro num canto inóspito de Portugal, em Portalegre, e depois no meio do eixo Lisboa-Braga, em Coimbra, fomos assumidos espetadores comprometidos daquele tempo, um tempo de chumbo. E lembrá-lo traz memórias que para sempre serão guardadas no lado bom da Vida, daquela Vida que merece ser vivida com intensidade, perigosamente. Mas a raiva nunca passará pelo que a canalha fez, aqui em Portalegre principalmente.
«Novembro» é um livro não do ‘lado errado da História’, mas sim uma obra que é um testemunho do que foi aquele estar e viver. Um dia mais tarde será relido, e então talvez a estória seja interpretada de outra forma, de outra maneira.
Haja a coragem de se ler «Novembro», de Jaime Nogueira Pinto!
Mário Casa Nova Martins