«Novembro» de Jaime Nogueira Pinto
Novembro é um mês cinzento, já a meio do outono. Os dias são
curtos, as noites longas, o frio está a chegar, bem como a chuva. As árvores
começam a despedir-se das suas folhas, há muito que o verde deu lugar aos castanhos, que as aves se
foram para sul e os animais ou hibernam ou se aconchegam uns com os outros.
Novembro é um mês triste!
É em Novembro de 1975 que termina o livro de Jaime Nogueira Pinto, com o mesmo nome. «Novembro» não é um romance histórico, como os de
Alexandre Herculano ou Rebello da Silva, também não é um romance como os de
Camilo Castelo Branco ou Agustina Bessa-Luiz, nem é um livro de História como os de
Joaquim Veríssimo Serrão ou Rui Ramos. «Novembro» de Jaime Nogueira Pinto é um
pouco de tudo e de todos. Não será a sua autobiografia, embora na obra ele
surja como um dos protagonistas. Também não é a história do namoro da sua vida,
mas é como se fosse. Mas é a história de um período da História de Portugal,
entre 1973 e 1975, tempos de final de Regime e tempos de Revolução, por ele
vivida e sentida.
Jaime Nogueira Pinto é mais um anti-herói, que herói em
«Novembro». Mas coloca-se no inner circle
da trama. E entrega os papéis de herói e heroína a terceiros, por quem é nítida
uma paixão, que não uma inveja.
Eduardo e Diana são para Alexandre tudo o que gostaria de
ser e que se resumia em ser filho-família, ele que é órfão e a viver com a mãe,
no fundo levando uma vida modesta como na época vivia a pequena burguesia.
Alexandre vive com complexos de inferioridade social, ele que nunca chumbara,
que lia tudo e via tudo no cinema. Mas ao longo do tempo vai entrando na
intimidade da família de Eduardo, chegando a conhecer e a apaixonar-se pela
irmã. Os amores entre Diana e Eduardo são de início clandestinos, e é um
desastre de guerra que vai permitir que passem a públicos. Amores, traições,
homossexualidade, apimentam a vida dos adultos, a começar pela do adulto-mor e
figura central do enredo, e simultaneamente pai de Inha e Eduardo.
Se esta é a parte do romance, a parte da história é o tempo que
antecede a Revolução do 25 de Abril de 1974, até ao fim do Verão Quente. Por todo
o livro é fácil identificar as personagens, os fatos são narrados ‘visto de
Direita’.
De centuriões a pretorianos, do Marcellismo à corporativista
Revolução dos Cravos, a chegada dos mercenários a soldo de uma ideologia de
Extrema-Esquerda que vai colapsar em 25 de Novembro de 1975, eis a história
contada por quem estava do seu ‘lado errado’!
Alexandre pertencia a uma Extrema-Direita não-Marcellista,
defensora do Ultramar e de Verdades que assimilara das leituras que fizera e dos
filmes que vira. Ideólogo e publicista, quer ascensão social, e encontra no
amor uma possível forma de a alcançar. Nos acontecimentos é mais espetador que interveniente.
O seu mundo alarga-se com a ida, fuga para Espanha, para Madrid. É Eduardo quem vai para o
Ultramar, para Angola, onde assiste ao estertor do Regime, onde participa na
contra-revolução, onde é preso, e de onde regressa sem sonhos, que não o de
e por Diana.
«Novembro» foi lido com carinho e raiva. Primeiro num canto inóspito
de Portugal, em Portalegre, e depois no meio do eixo Lisboa-Braga, em Coimbra, fomos
assumidos espetadores comprometidos daquele tempo, um tempo de chumbo. E lembrá-lo traz
memórias que para sempre serão guardadas no lado bom da Vida, daquela Vida que
merece ser vivida com intensidade, perigosamente. Mas a raiva nunca passará pelo
que a canalha fez, aqui em Portalegre principalmente.
«Novembro» é um livro não do ‘lado errado da História’, mas
sim uma obra que é um testemunho do que foi aquele estar e viver. Um dia mais
tarde será relido, e então talvez a estória seja interpretada de outra forma,
de outra maneira.
Haja a coragem de se ler «Novembro», de Jaime Nogueira
Pinto!
Mário Casa Nova Martins
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