António Martinó de Azevedo Coutinho
Começámos, e convém não perder isso de vista, com a contestação francesa à cadeia McDonald’s, por via do “indevido” uso de Astérix como seu agente publicitário.
Entretidos por aqui com mil e um outros pretextos, até a política -imagine-se!- teremos perdido de vista o irredutível gaulês?
De modo algum. Os tempos lusos mais modernos, estas últimas décadas, não deixaram esquecer os ídolos mais populares do universo BD. Deles aqui fica um singelo punhado de curiosos exemplos soltos, limitando a selecção à dupla Tintin/Astérix.
Porém, se ultrapassarmos as nossas limitadas fronteiras e nos projectarmos no universo aos quadradinhos, talvez escolhesse pessoalmente um outro exemplo, quase absoluto, sobre a profunda influência da BD, dos seus mitos e heróis nos domínios da publicidade.
Teremos de recuar umas largas décadas, aos tempos em que o acto de fumar era publicamente incentivado e em que a imagem do fumador era associada à própria virilidade, coragem e afirmação pessoal. Foi assim que ficou célebre, como autêntica imagem de marca, o cowboy da Marlboro.
Lucky Luke, o mais influente cowboy dos quadradinhos, integra a série europeia mais popular e mais vendida depois de Tintin e Astérix. Ele surgiu másculo, sempre com o cigarro ao canto da boca, na imagem que Morris (Maurice de Bévère) dele criou em 1946. Porém, em 1983, sensível a inúmeras críticas e a sensatas sugestões, Morris substituiu-lhe o cigarro por uma inocente palha. A Organização Mundial de Saúde, reconhecendo o enorme significado publicitário deste gesto, atribuiu ao desenhador belga uma sua condecoração, em 1988. O actor Terence Hill, nas mais recentes adaptações cinematográficas de Lucky Luke, protagonizou a radical mudança...
Muito recentemente, esta questão da publicidade ou promoção do tabaco por intermédio de personagens da BD viveu mais um inesperado episódio. Foi em Fevereiro deste ano que as agências noticiosas trouxeram ao mundo a informação de que o Alto Conselho Turco para os Meios Audiovisuais tinha imposto uma multa de cerca de 24 000 euros à cadeia privada TV8, por esta ter mostrado, numa cena de um filme de animação da série Tintin, o capitão Haddock fumando cachimbo. No entanto, a aplicação da coima não terá sido consensual porque um membro do Alto Conselho terá considerado que as crianças são perfeitamente capazes de distinguir as personagens reais das fictícias. Em vão...
O lado hipócrita deste episódio consiste em que a Turquia, que decretou recentemente esta lei censória, é o 10.º produtor mundial de tabaco enquanto as estatísticas oficiais mostram que um terço dos turcos adultos fuma...
António Martinó de Azevedo Coutinho
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home