\ A VOZ PORTALEGRENSE: JANUS / Presidente da CMP

quarta-feira, junho 09, 2010

JANUS / Presidente da CMP


Entre o charlatão e o vendedor de banha da cobra

A Associação JANUS – Projecto Cultural levou a cabo na passada terça-feira dia 1 de Junho de 2010 a sua segunda iniciativa com novo jantar/conferência, desta vez com o actual presidente da Câmara Municipal de Portalegre.
Como membro da JANUS entendemos ser nosso dever estar presente, mas com o firme princípio de que não colocaríamos qualquer questão ao convidado, assim como não nos contraporíamos a nada que o mesmo afirmasse. Deveres de civilidade tal justificavam.
Mas não deixa de ser curioso referir um facto que nada tendo a ver com o convidado, tem a ver com algo que se passou numa das mesas de convidados. É que quando vem uma travessa para a mesa, quem se serve não deve escolher o que tira da travessa, mas sim servir-se da forma mais aleatória e natural… Coisas de etiqueta, melhor, de educação, que só o ‘berço’ dá.
Foi com prudência nas palavras que o presidente da Câmara Municipal de Portalegre começou a sua conferência. Sem a exuberância que o caracteriza quando fala em público, questionou a forma como o chamado comércio tradicional se movimenta em Portalegre, fazendo-lhe, dizemos, justas críticas.
Mas como diz o ditado popular, ‘a culpa não morreu solteira’ e a CMP, desde mandatos de outros presidentes, também tem uma parte na culpa pela decrepitude em que está o comércio tradicional.
Continuando, afirmou que, quanto ao falado Centro Comercial a ser implantado em Portalegre, tudo o que é burocracia camarária está resolvido, faltando a empresa iniciar a construção. Todavia, não disse que o dito Centro Comercial foi deslocalizado para Elvas, nunca passando, portanto, de mais um projecto que não se concretizou.
Também falou da construção de quatro novos hotéis em Portalegre, passando a elogiar o sucesso do hotel recém-construído na periferia da cidade, que tem, disse, uma elevada taxa de ocupação, em muito superior à que tinha o desactivado e central Hotel D. João III. A ser verdade, e não temos elementos para duvidar, não deixa de ser um paradoxo. Um hotel no centro da cidade, em qualquer terra, é sempre mais procurado do que um periférico.
E continuando a falar de turismo, disse que mesmo quando estava a chegar ao restaurante, lhe tinha sido comunicado por alguém de direito, que havia ‘novidades para breve’, e no sentido positivo, quanto ao denominado ‘projecto do Grupo Pestana’.
Por mais de uma vez, este projecto foi tema quer de promessa político-eleitoral por parte do actual presidente da CMP, quer de notícia na comunicação social local. É um facto que o Grupo Pestana comprou um vasto terreno no concelho de Portalegre. E, curiosamente, depois de aquele negócio ter sido feito, terrenos envolventes foram vendidos a particulares, quiçá na esperança destes novos proprietários realizarem mais-valias, esperançados, primeiro que o projecto iria para diante, segundo que depois de um sucesso avassalador necessitasse de se expandir e os terrenos adjacentes, que foram vendidos a baixo preço, teriam então fortíssima valorização.
Mas, pese embora a esperança num final feliz para o projecto por parte quer do presidente da CMP, quer dos vizinhos do empreendimento, o mesmo não se vai realizar. É mais um sonho irrealizável para o concelho de Portalegre.
Depois de ao longo dos anos o presidente da CMP apresentar ‘milhentos’ projectos salvadores do concelho a que precise, chegou a vez de se interessar pelas energias alternativas. A seguir a falar do que já foi feito em aproveitamento da energia solar, disse-se apostado na criação no concelho de uma Central de Biomassa. «A Unidade de Biomassa tem na base da sua actividade a promoção da diversificação energética, nomeadamente pelo uso da biomassa florestal residual (BFR)».
Outra temática que abordou foi o futuro da Zona Industrial. Não deixou de dizer, mas sem quantificar, que os projectos previstos para a Zona Industrial, a concretizarem-se, mudarão a face da cidade e do concelho. Curioso foi utilizar a expressão ‘a concretizarem-se’, no que é uma novidade no seu habitual discurso, onde tudo era sempre ‘facto consumado’.
Terminou falando de acessibilidades, sem inovar nas propostas.
Seguiu-se o período de perguntas ao convidado.
Iniciou-o o presidente da Assembleia Municipal de Portalegre. Pessoa afável, inteligente, perguntou em que ponto ia o projecto da Central de Biomassa e qual o ponto da situação acerca do projecto do Grupo Pestana. De certeza que as questões não eram para fragilizar o presidente da CMP, mas, de facto, foi isso que sucedeu.
O presidente da CMP reconheceu que a Central de Biomassa não passava de uma ideia, e que seria difícil de concretizar, sendo uma das principais razões a falta de matéria-prima. É que embora grande parte do concelho de Portalegre integre o vasto Parque Natural da Serra de São Mamede, este não produz matéria-prima suficiente, porque a mata é insuficiente e grandes áreas são de urzes e outros produtos florestais inapropriados.
E continuando a falar do Parque Natural e da Serra de São Mamede, reconheceu estar ambos subaproveitados, lembrando que a Barragem da Apartadura é insuficiente para a função que desempenha estando, dada a sua pequenez, sempre muito dependente de ciclos de chuva e de seca, quando a própria serra é a mãe-de-água mais importante de todo o Alentejo, disse.
Quanto ao projecto do Grupo Pestana reconheceu ter tido conhecimento das últimas notícias mesmo a chegar ao restaurante, e que no fundo não as mesmas deixavam de ser vagas, não podendo adiantar mais do que dissera na conferência. Uma elucidação complementar de um outro convidado, que se disse parte integrante e interessada do processo, não foi mais do que repetir o que o presidente da CMP dissera.
Ora essa vagueza tem sido o tónico deste projecto salvífico, onde tudo se reduz ao vazio. Curioso!
Mais questões foram colocadas, uma delas, pertinente e correcta, referente à demografia e sua importância no desenvolvimento regional.
Mas este período de perguntas foi ‘agitado’ por um episódio deveras hilariante. Um convidado questiona e discursa em simultâneo sobre o TGV.
Voltou-se a falar de acessibilidades, e o presidente da CMP fala das relações de Portalegre com Plasencia e Cáceres, como alternativa ao eixo Mérida, Badajoz, Elvas e Évora.
Porém, as boas intenções do autarca esbarram com a geografia. O parceiro privilegiado de Cáceres e Plasencia é Castelo Branco. Plasencia e Cáceres estão ligadas por auto-estrada. Ambas em breve estarão ligadas de auto-estrada à fronteira de Segura, e depois do lado português a Castelo Branco. E pela A23 chegam a Lisboa e Porto. Se quiserem ir para o Algarve seguem de auto-estrada até Mérida, Zafra, Sevilha, entrando em Portugal em Vila Real de Santo António. Elementar!
Em jeito de resumo, diga-se que o presidente da CMP teve uma intervenção correcta em todos os aspectos. Repetimos que nunca o questionámos no que disse, mesmo não concordando em múltiplos aspectos como se infere da leitura deste escrito, porque, no fundo, ao ser um convidado da JANUS o era de quem a compõe. Os convidados presentes, se o entendessem, tinham a função de o confrontar com factos, concordando ou discordando.
Ao longo dos anos o presidente da CMP anunciou que vinha para Portalegre todo o tipo de investimentos, o que se tem revelado falso. Desta forma, é licito dizer que tem privilegiado o contacto com gente que o engana, gente a que na gíria se chama de charlatão ou de vendedor de banha da cobra.
E é um homem amargurado, impotente, derrotado, quando, já no final, faz uma espécie de confidência, que foi ouvida por toda a sala. Essa confidência não deixa de ser, e uma vez mais, também uma forma de desculpabilização do que não consegue fazer. Mas o que confidenciou é verdade, é verdadeiro. Mas o próprio sabe os porquês.
Por fim, dizer-se que tudo terminou com mais um acto histriónico do mesmo convidado, já acima referido. Nova intervenção, agora a assumir em pleno o protagonismo num discurso pró-TGV. Mas a argumentação apresentada fez rir o próprio, e a ‘atenta’ assistência.
Mário Casa Nova Martins