Luís Pargana
DESABAFOS - XI
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“Elefantes brancos”
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Conta a lenda que, na Índia longínqua, quando os Rajás queriam fazer uma oferta com distinção, ofereciam um elefante, de uma raça rara, porque tinha pelo branco. Este elefante não servia para trabalhar, nem sequer para a caça, por causa da sua cor e implicava grandes cuidados, nomeadamente com a sua limpeza.
Para o proprietário, este elefante branco não servia rigorosamente para nada, a não ser para deleite visual e, pelos cuidados que exigia, para além da sua alimentação, significava, muitas vezes a ruína do seu proprietário.
A expressão “elefante branco” que hoje utilizamos está, deste modo, associada a uma coisa, um projecto, ou um negócio de manutenção muito dispendiosa, sendo o seu rendimento de pouca ou nenhuma utilidade.
Se pensarmos um pouco, não teremos dificuldade em identificar “elefantes brancos” no nosso país, nas nossas cidades e vilas, até nos nossos locais de trabalho.
Normalmente associamos a expressão a novos empreendimentos que, por corresponderem a novos projectos e implicarem novos hábitos de utilização, correm o risco de ficar aquém da sua real dimensão e expectativa de utilização.
É por isso que, antes de se construir um teatro, só para dar um exemplo, se devem trabalhar os públicos, fidelizando rotinas e hábitos de fruição cultural, ainda que em espaços informais de apresentação de espectáculos, para que quando a nova sala abra portas, não corra o risco de ficar vazia. Esse trabalho prévio foi feito em Portalegre, antes da abertura do Centro das Artes do Espectáculo da cidade, o que contribuiu para a regular frequência de públicos nas suas ofertas culturais, o que é de saudar.
Outro equipamento cultural de sucesso, na nossa cidade, é a Biblioteca Municipal que funciona no antigo Convento de Santa Clara e que, não obstante o longo tempo que levou até à conclusão das suas obras de restauro e recuperação, conseguiu imprimir uma dinâmica de centro cultural que faz com que seja uma Biblioteca de referência no plano local e nacional.
Mas, se os exemplos que referi são exemplos de sucesso, outros há que fazem jus ao nome de “elefantes brancos” e que nunca chegaram a servir, de facto, para os objectivos com que foram feitos. Infelizmente, alguns destes projectos desaproveitados foram obras emblemáticas do Programa Polis, e que agora definham sem a dimensão de espaço público que lhes deveria ter sido conferida. É o caso do Castelo de Portalegre e da sua Barbacã, duas obras que podendo ser emblemáticas da relação entre o património e a sua reinvenção contemporânea, se encontram vazias, desaproveitadas e divorciadas da Cidade que nunca foi suficientemente cativada para as sentir como suas e delas tirar proveito – Dois “elefantes brancos”, na verdadeira acepção do termo!
Mas os “elefantes brancos” não se declaram só por maus aproveitamentos de novas obras e pelo desleixo que resulta da falta de dinâmica no seu aproveitamento público. Também temos casos de equipamentos que, por serem substituídos, ou por serem apanhados na dobra de um mau planeamento urbanístico, acabam por se transformar no tal animal de luxo do tempo dos Rajás, só que, desta vez, sem lustro no pelo e a necessitarem de cuidados urgentes.
O exemplo mais paradigmático será, porventura, o histórico edifício dos Paços do Concelho, na sempre eterna Praça do Município. Com a deslocalização dos serviços camarários para a restaurada Fábrica Real, este edifício de cuja varanda se proclamou, em 1640, o apoio à Restauração de Portugal, tarda em definir um rumo para a sua utilização, em moldes compatíveis com o significado da sua história e a dignidade da Praça onde está implantado, junto à Sé Catedral que nasceu com a Cidade e a ajudou a crescer. Entre realidades virtuais, finanças e outras ocupações temporárias, este edifício vai definhando, ao mesmo tempo que definha toda a parte alta da Cidade, abandonada de gentes e de vida e onde até o tradicional comércio daquela que em tempos foi a principal rua da cidade, se vai transferindo para melhores paragens.
Mas outros “elefantes brancos” se anunciam: Como é o caso do Estádio Municipal que, recentemente foi alvo de acesa polémica, em torno da sua eventual transformação em escola dita de referência. Condenado desde o tempo em que o poder municipal decidiu desenvolver um parque desportivo na entrada sul de Portalegre, este equipamento desportivo da Cidade tem sido progressivamente desleixado nos cuidados que necessita, como se alguém quisesse mostrar que se não morre de “morte matada”, há-de morrer de “morte morrida”.
É tempo de os responsáveis municipais olharem para os equipamentos da Cidade com o sentido de responsabilidade que deve nortear o exercício dos seus cargos públicos, cuidando dos bens que são de todos e fazendo com que se tornem úteis e rentáveis para a qualidade de vida dos portalegrenses.
6 de Abril de 2010
Luís Pargana
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