Estado da Índia
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O PRESIDENTE da República visita para a semana Goa, no âmbito da sua visita oficial à Índia. Subsiste um contencioso entre Portugal e a Índia por causa de Goa, Damão e Diu. Goa não foi descolonizada, foi ocupada militarmente pela Índia.
A situação é idêntica à de Timor, só que neste último caso Portugal respeitou o Direito Internacional, enquanto que quanto a Goa se rendeu perante uma violação grosseira do Direito Internacional, e reconheceu, em Dezembro de 1974 (ainda cor cima, através de um Governo provisório, portanto, sem mandato popular para tão importante decisão), a ocupação militar, contra o Direito Internacional e contra a condenação dessa ocupação pelas Nações Unidas.
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NO QUADRO desse contencioso colonial, e depois do reatamento das relações entre os dois Estados, Portugal já concedeu à Índia tudo o que esta lhe pediu e até o que ela nunca pediu. Alguns exemplos. Portugal entregou ao Banco Central da Índia, e não aos depositantes, os valores que estes tinham depositado nos cofres da filial em Goa do Banco Nacional Ultramarino, e que Portugal, na véspera da ocupação, colocara a salvo em Lisboa. Resultado: os valores nunca chegaram às mãos de mais de oitenta por cento dos depositantes, perante os quais, portanto, Portugal continua, a ser responsável.
Mais recentemente, Portugal tem vindo a assistir impavidamente à venda de passaportes portugueses em Bombaim, em Goa, em Lisboa, a cidadãos indianos que nunca tiveram laços nem com Portugal nem com Goa, com base na utilização fraudulenta de certidões de nascimento de cidadãos portugueses que ficaram no que resta das antigas Conservatórias do Registo Civil portuguesas em Goa, Damão e Diu. Ou seja, a nacionalidade portuguesa está à venda em centros comerciais para cidadãos da Índia e apenas para estes poderem ter livre entrada no espaço da União Europeia.
Por outro lado, quando de visitas anteriores de altas individualidades portuguesas a Goa, os chamados freedom's fíghters, do período colonial, foram por elas agraciados apesar de terem matado militares e civis portugueses...
Entretanto, o Estado Português e o município de Lisboa doaram, no Lumiar, um terreno, com o valor de muitos milhões de euros, que pertencia aos munícipes de Lisboa, para a comunidade hindu erguer as suas instalações.
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EM contrapartida, o que é que a Índia tem dado a Portugal?
A manutenção do confisco de propriedades de cidadãos portugueses, só por serem portugueses, e que, à data da ocupação, trabalhavam para Portugal em Goa e que, por isso, se retiraram depois daquele território. Foi-lhes aplicado o estatuto de 'evacuados' e, consequentemente, os seus bens foram colocados sob administração das autoridades indianas.
O mais curioso é que, nos últimos anos, o Governo do Estado de Goa diz-se disposto a devolver os bens confiscados aos seus proprietários, desde que Portugal, e no quadro das relações de Estado para Estado, o solicite. Portugal tem, desde os anos 80, requerimentos dos lesados a pedir-lhe que - no âmbito da protecção diplomática que lhes deve, tanto à face do art. 14° da Constituição Portuguesa como do Direito Internacional ao qual Portugal se obrigou - exija da Índia a devolução dos bens confiscados aos seus cidadãos.
Mas o Estado Português tem deixado atrasar o problema, apenas por causa de um estúpido e injustificado complexo de culpa por ter estado 450 anos em Goa.
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ESTE Presidente da República já deu, ao longo da sua carreira política, sinais constantes de ser uma personalidade com elevado sentido de Estado. Jurou cumprir a Constituição e está a cumpri-la.
Por seu lado, a nossa diplomacia, que é das melhores do mundo, terá que compreender que o desejo, por todos nós compartilhado, de reforçar os laços históricos de amizade e cooperação entre Portugal e a Índia, passando, de modo especial, pêlos antigos territórios portugueses no subcontinente indiano, não dispensa Portugal de defender, com firmeza, os direitos e interesses, seus e dos seus cidadãos.
Nas relações internacionais, os Estados (particularmente os pequenos Estados, como é o caso de Portugal) só ganham respeito quando demonstram que as relações entre Estados também têm a presidi-las valores e princípios, dentro dos quais ocupa lugar de destaque o primado do Direito Internacional.
A situação é idêntica à de Timor, só que neste último caso Portugal respeitou o Direito Internacional, enquanto que quanto a Goa se rendeu perante uma violação grosseira do Direito Internacional, e reconheceu, em Dezembro de 1974 (ainda cor cima, através de um Governo provisório, portanto, sem mandato popular para tão importante decisão), a ocupação militar, contra o Direito Internacional e contra a condenação dessa ocupação pelas Nações Unidas.
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NO QUADRO desse contencioso colonial, e depois do reatamento das relações entre os dois Estados, Portugal já concedeu à Índia tudo o que esta lhe pediu e até o que ela nunca pediu. Alguns exemplos. Portugal entregou ao Banco Central da Índia, e não aos depositantes, os valores que estes tinham depositado nos cofres da filial em Goa do Banco Nacional Ultramarino, e que Portugal, na véspera da ocupação, colocara a salvo em Lisboa. Resultado: os valores nunca chegaram às mãos de mais de oitenta por cento dos depositantes, perante os quais, portanto, Portugal continua, a ser responsável.
Mais recentemente, Portugal tem vindo a assistir impavidamente à venda de passaportes portugueses em Bombaim, em Goa, em Lisboa, a cidadãos indianos que nunca tiveram laços nem com Portugal nem com Goa, com base na utilização fraudulenta de certidões de nascimento de cidadãos portugueses que ficaram no que resta das antigas Conservatórias do Registo Civil portuguesas em Goa, Damão e Diu. Ou seja, a nacionalidade portuguesa está à venda em centros comerciais para cidadãos da Índia e apenas para estes poderem ter livre entrada no espaço da União Europeia.
Por outro lado, quando de visitas anteriores de altas individualidades portuguesas a Goa, os chamados freedom's fíghters, do período colonial, foram por elas agraciados apesar de terem matado militares e civis portugueses...
Entretanto, o Estado Português e o município de Lisboa doaram, no Lumiar, um terreno, com o valor de muitos milhões de euros, que pertencia aos munícipes de Lisboa, para a comunidade hindu erguer as suas instalações.
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EM contrapartida, o que é que a Índia tem dado a Portugal?
A manutenção do confisco de propriedades de cidadãos portugueses, só por serem portugueses, e que, à data da ocupação, trabalhavam para Portugal em Goa e que, por isso, se retiraram depois daquele território. Foi-lhes aplicado o estatuto de 'evacuados' e, consequentemente, os seus bens foram colocados sob administração das autoridades indianas.
O mais curioso é que, nos últimos anos, o Governo do Estado de Goa diz-se disposto a devolver os bens confiscados aos seus proprietários, desde que Portugal, e no quadro das relações de Estado para Estado, o solicite. Portugal tem, desde os anos 80, requerimentos dos lesados a pedir-lhe que - no âmbito da protecção diplomática que lhes deve, tanto à face do art. 14° da Constituição Portuguesa como do Direito Internacional ao qual Portugal se obrigou - exija da Índia a devolução dos bens confiscados aos seus cidadãos.
Mas o Estado Português tem deixado atrasar o problema, apenas por causa de um estúpido e injustificado complexo de culpa por ter estado 450 anos em Goa.
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ESTE Presidente da República já deu, ao longo da sua carreira política, sinais constantes de ser uma personalidade com elevado sentido de Estado. Jurou cumprir a Constituição e está a cumpri-la.
Por seu lado, a nossa diplomacia, que é das melhores do mundo, terá que compreender que o desejo, por todos nós compartilhado, de reforçar os laços históricos de amizade e cooperação entre Portugal e a Índia, passando, de modo especial, pêlos antigos territórios portugueses no subcontinente indiano, não dispensa Portugal de defender, com firmeza, os direitos e interesses, seus e dos seus cidadãos.
Nas relações internacionais, os Estados (particularmente os pequenos Estados, como é o caso de Portugal) só ganham respeito quando demonstram que as relações entre Estados também têm a presidi-las valores e princípios, dentro dos quais ocupa lugar de destaque o primado do Direito Internacional.
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Fausto de Quadros
Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
in, SOL, 6/1/2007, p. 27
Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
in, SOL, 6/1/2007, p. 27
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