Luís Filipe Meira
Os
Sons de 2012
.
I - O
Regresso dos Heróis
.
João Lisboa, crítico
de música no Expresso e seguramente um dos mais preparados analistas da música
popular - fenómeno que nasceu nos middle 50´s do século passado e que
desde aí tem vindo a deixar uma marca indelével na evolução do pensamento
artístico e na maneira de estar e ser de várias gerações em relação às artes
- escrevia no último sábado e a propósito do habitual balanço de final de ano,
que em 2012 apenas uma vintena de gravações se pode gabar de não cheirar a mofo
ou de não provocar uma enjoativa sensação de déjà vu. Por sua vez, Kevin
Parker, o cérebro dos australianos, Tame Impala que colocaram Loneirism,
produção 2012, em lugares de destaque nas listas dos melhores do ano, dizia, em
entrevista ao suplemento ipsílon, que
“adorava mais a ideia de música pop do
que a música pop propriamente dita. Pela inocência, emoção e pureza, que outras
músicas, mais intelectuais, não têm. Com a música pop só temos que deixar que
ela nos afete”.
E, neste particular,
por muito respeito que tenha – e tenho – por João Lisboa, estou mais perto da
posição de Kevin Parker. A música pop
é emoção pura, muitas vezes feita a partir de duas notas e essa emoção, inocência
e pureza, jamais poderá ser substituída pela técnica ou por outros recortes
virtuosistas de iluminados. Por mim não vem mal ao mundo que haja discos que
vão beber ao passado – as influências na
música pop, propriamente dita, são fenómenos mais ou menos cíclicos – desde que continuem a reavivar e a
estimular as emoções de quem a ouve.
Posto isto diria
que 2012 foi um bom ano, não um ano excecional pois não poderemos dizer que
tenha havido uma obra marcante, mas houve bons discos e para todos os gostos. Por
uma questão pragmática, dividi esta reflexão em três capítulos: O
Regresso dos Heróis, Alma Lusitana e A Música Popular Como Arte Intergeracional
e Global.
O Regresso dos
Heróis
Em 2012 houve pelo
menos uma boa dúzia de senhores de currículo apreciável, mas de idades quase
provectas, que regressaram com obras de enorme folego e qualidade.
Bruce
Springsteen que
passou por Portugal com o tour de divulgação de Wrecking Ball, que está muito perto dos melhores “Springsteens” de
sempre, mostrou que aos 63 anos está para lavar e durar.
Bob
Dylan com 71
anos gravou Tempest, que não sendo um
“Dylan vintage”, é um Dylan que mostra bem que o enorme
talento e criatividade desse profeta dos idos anos 60 do seculo passado se
mantêm inalteráveis.
Leonard
Cohen que voltou
às digressões e aos discos por necessidade, o contabilista deu-lhe o golpe e
deixou-o falido, renasceu, quem sabe motivado pelo choque, para um “comeback” de grande nível. As
digressões são muito boas e já o trouxeram recentemente a Portugal por duas
vezes. Este ano ofereceu-nos um ótimo disco, “Old Ideas” não traz inovação, mas traz-nos um belo conjunto de
ideias sólidas muito bem produzidas e melhor interpretadas.
Caetano Veloso
também tem disco novo, “Abraçaço” de
seu nome. Nuno Pacheco, crítico de música brasileira no Público, diz que em 15 anos é a sua primeira obra-prima. No Expresso, o especialista de world music, João Santos, coloca-o no
top ten do ano… E se querem saber a minha opinião, apenas acrescentaria que
Veloso, que sempre mantive no meu radar, surpreendeu-me com a força e
intensidade deste “ Abraçaço”.
Para encerrar o top five dos veteranos, há uma série de
candidatos muito fortes com discos muito bons:
“Banga” de Patti Smith, “Locked Down” de Dr.
John,” The Bravest Man in Universe” de Bobby Womack, “That's Why God Made the
Radio” dos Beach Boys,”Psychedelic Pill”
de Neil Young com os Crazy Horse e
que demonstrou aos 67 anos a sua vitalidade gravando um segundo álbum, “Americana”,
com uma curiosa abordagem ao song book norte americano.Uma grande e
agradável surpresa veio de Johnny Lydon, o ex Sex Pistol, que também regressou
em grande forma com “This is PIL”, o seu primeiro álbum de estúdio em 20
anos.
Todos eles poderiam de uma forma
mais ou menos pacífica e mais ou menos justa, ocupar um honroso 5º lugar nesta
minha lista. Mas prefiro o ex-aequo, pois o valor enquanto obra, apesar das
enormes diferenças de conceção, é muito semelhante.
Finalmente e para encerrarmos este capítulo sobre os veteranos,
gostaria de assinalar que os Dexy´s Midnight Runners, banda chave na
recuperação da soul music em Inglaterra na década de 80, regressou a
estúdio 27 anos depois para gravar “One Day I´m Going to Soar”,
ainda não ouvi o disco, mas tenho lido referências muito boas, e confesso que
estou curioso. Paul McCartney também esteve em estúdio para gravar “Kisses
on the Bottom”, um disco muito digno e bem tocado, com covers de
música pop tradicional.
E agora sim, para terminar, “the last but not the least”, “The Brian
Ferry Orchestra” que gravou The Jazz Age ou seja, Brian Ferry
pegou em 13 canções de sucesso do período dos Roxy Music e da sua
carreira a solo, passou-as pela máquina do tempo e levou-as até à “golden age”
do jazz. O resultado é magnífico e empolgante. Ouvir “Slave to Love, Avalon,
Love is the Drug ou Don´t Stop the Dance”em registo jazz style
anos 20 é uma verdadeira delícia.
O próximo capítulo deste Sons/
012 será sobre a Alma Lusitana,
que chora lágrimas de sangue no dia-a-dia, mas que na música está, pelo menos
esteve em 2012, muito bem…e recomenda-se.
Luís Filipe Meira
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