\ A VOZ PORTALEGRENSE: Mário Silva Freire

domingo, junho 28, 2009

Mário Silva Freire

BANCOS QUE FIZERAM HISTÓRIA
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Não, não são desses bancos que os leitores estarão a pensar e de que, infelizmente, tanto se fala, nos dias de hoje. Esses, se fizerem História, serão pelas piores razões.
Ora, eu estou a pensar, muito simplesmente, nos outros bancos que existiam em Portalegre, naqueles que servem para nos dar descanso às pernas e, por vezes, à alma mas que, ao mesmo tempo, conseguiam deleitar-nos de várias maneiras.
Uns, em locais aprazíveis, no interior dos jardins, como aqueles que existiam no Jardim do Tarro, eram cómodos, de madeira e aí até apetecia ler um livro, ao ouvir o chilrear da passarada, ou manter uma amena cavaqueira com algum amigo ou conhecido. Agora, nessa zona da cidade, se nos quisermos sentar, teremos que voltar as costas ao jardim e contemplar essa paisagem tecnológica de automóveis a passar, cheirando o que lhes sai pelos tubos de escape ou estacionados, junto a nós.
Outros desses bancos não tinham a envolvê-los a paisagem bucólica do verde das plantas e do chilreio dos pássaros; antes, pelo contrário, estavam junto à zona do negócio das gentes simples que vinham ao Mercado Municipal comprar e vender. Eles, no entanto, continham motivos mais que suficientes para lhes darmos atenção, com vistas panorâmicas da cidade no azulejo que lhes cobria as costas. Pelo menos, um desses bancos, segundo a Prof. Isilda Garraio (Portalegre Azulejaria – um olhar sobre a cidade, ed. Escola Secundária de S. Lourenço, 1998, p.73) era assinado por Arsénio da Ressurreição e datado de 1953.
Outros bancos, ainda, tendo a envolvê-los a paisagem típica de um jardim, como o era o da Corredoura, tinham como motivo de decoração no azulejo “elementos tipicamente ligados ao Alentejo, tais como: habitações, instrumentos ligados às práticas agrícolas dominantes na região, assim como referências à fauna e à flora locais”, citando, ainda, Isilda Garraio.
Queria terminar esta breve crónica com um pequeno poema que diz:

“O livro que ahi vai – obra d’um incoherente –
É um livro brutal, é um poema a esmo…
Pensei-o pela rua olhando toda a gente
Escrevi-o no meu quarto, olhando-me a mim mesmo”


Muitos dos que vivem na cidade, certamente, hão-de ter já identificado o autor desta quadra: José Duro. E lembraram-se do local onde ela estava inscrita: no Jardim da Corredoura. Era em azulejos, num banco por onde as pessoas passavam, se sentavam, liam e recordavam. Esse banco constituía uma homenagem daqueles que foram estudantes no findar da primeira metade do século passado a esse vulto portalegrense da poesia que viveu entre 1875 e 1899. Em vez desse banco, nesse mesmo Jardim, existe hoje um medalhão em local oculto (ou quase), muito maltratado, onde já lhe faltam alguns dos algarismos referentes às datas atrás referidas.
Enfim, para se avançar no futuro é preciso que não se maltrate o passado, principalmente quando ele nos acrescenta dignidade! E Portalegre precisa de avançar!
Mário Freire