António de Oliveira Salazar
.
Decididamente, já não falta tudo em matéria de subsistências. E isto sem nos referir ao indigitado comissário e nosso ilustre amigo sr. Oliveira Bello – que esse falta ainda... nomeá-lo. A nossa referência põe simplesmente em foco um livro. Verdade seja, porém que é um bom livro e neste caso pôde talvez repetir-se com rara propriedade que nem só de pão vive o homem...
O livro em questão é a separata do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra que dessa revista acaba de ser destacado e que tem por autor o professor de economia política daquela Universidade, sr. dr. Oliveira Salazar. O assunto, como dissemos, é o problema das subsistências - ou antes, alguns aspectos desse problema, segundo o enunciado do autor.
Antes de mais, seja-nos permitido que felicitemos o professor Salazar pela sua inteligente iniciativa. Em um país cuja administração pouco mais é do que uma atrabiliária mistura de arbítrios e de acasos, urge que os homens de ciência, sob pena de ás suas responsabilidades no desastre colectivo, indiquem pelo menos aos homens de acção quais são as regras para aquém ou para além das quais um governo só pode encontrar a falência como solução que tem apenas como duvidosa a demora.
Mas vejamos o livro.
O professor Salazar começa por estabelecer as condições económicas criadas pela guerra e que vêem a ser as de as nações, em vez de se abastecerem pela troca internacional e se limitarem a produzir segundo as suas aptidões mais pronunciadas, procurarem pelo contrario formar estados económicos independentes, isto é, tanto quanto possível, bastar-se a si próprias.
Define depois o ilustre professor a crise das subsistências como um dos aspectos que tem revestido a crise económica geral, a qual se resolve entre nós na deficiência de algumas substâncias alimentícias e numa alta pavorosa de preços, mesmo quanto aos géneros cuja produção é suficiente para o consumo. Neste capítulo, tanto quanto permitem os dados estatísticos publicados, fixam-se alguns algarismos que ficarão sendo de interessante e elucidativa consulta.
O autor procura ainda, para acabar de caracterizar a crise presente, a qual é directamente provocada por defeitos na produção, distribuição e consumo dos géneros alimentícios, dizer quais são os vícios da organização social portuguesa que se opõem à sua regular solução, e que por isso devem considerar-se também causa da crise.
Assim fica posto, a bem dizer, o problema.
O sr. dr. Oliveira Salazar compendia depois as três ordens de soluções que comporta a crise das subsistências;
a) Mais rápida e equitativa distribuição dos produtos.
b) Aumento de produção nacional.
c) Restrições do consumo.
Em todos estes aspectos o sr. dr. Salazar constata a falência da política económica portuguesa.
Quanto à distribuição é indispensável com efeito, que os poderes públicos se substituam ao comércio, incapaz de, por si só, assegurar a sua regularidade em tempo de crise. Mas a falta de estatísticas, a falta de estabilidade governamental, a falte de pessoal habilitado, a falta de transportes, a arbitraria centralização dos serviços sem conhecimento do único agregado coesivo que, segundo o autor, é a freguesia - aí estão outras tantas causas da falência do Estado neste primeiro aspecto da questão.
Quanto ao aumento da produção nacional, recorda-se no livro que estamos examinando todo um programa… que infelizmente não tem passado dos livros. É neste particular que reside a salvação de Portugal. O sr. dr. Salazar nunca o deixará suficientemente ponderado.
Quanto ás restrições do consumo o autor examina sucessivamente a sua obtenção pelo sacrifício das necessidades, pela sua satisfação com sucedâneos mais económicos e pelo melhor aproveitamento das riquezas consumidas.
O prof. Salazar pergunta ao terminar o seu livro: «Terá ainda solução esta crise?»
Não é fácil, talvez, responder. O que é certo, como diz o autor, é que «a nossa preparação para o futuro tem já neste momento todos os defeitos contrários ás qualidades exigidas: precisava-se uma baixa remuneração de trabalho, os salários sobem em proporções incríveis; urgia dispor de uma maior força produtiva, a capacidade de trabalho é diminuída por greves incessantes e numerosas; necessitavam-se as subsistências baratas, a alta dos seus preços parece não ter limites... Provavelmente nós sofreremos a guerra - quando começar a Paz».
Pelo seu interesse, pela sua elevação, pela sua oportunidade procurámos dar uma ideia de como o professor Oliveira Salazar encara o problema das subsistências.
Resta nos juntar à nossa homenagem - a expressão do nosso agradecimento pela gentileza da oferta. E se nos é permitido ainda manifestar um voto - aqui deixamos consignado o desejo de que o sr. dr. Oliveira Salazar, descendo ainda mais ao campo das instantes realidades económicas deste a um tempo tão rico e tão desgraçado país, traga para a sua resolução o ensinamento do seu estudo e o prestígio do seu talento.
in, Cousas de Portugal (Durante a guerra; depois da guerra), p. 133 a 136
FERNANDO EMYGDIO DA SILVA
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home