Quarto Centenário do Nascimento
Pregado na igreja da Misericórdia de Lisboa, ano de 1655 (1)
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Domine, memento mei, cum veneris in regnum tuum…. Hodie mecum eris in Paradiso (2).
Luc. 23
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(…)
Assim como Cristo Senhor Nosso disse a Dimas (3) hodie mecum eris in paradiso, hoje serás comigo no Paraíso, assim disse a Zaqueu hodie salus domiu huic facta est (4), hoje entrou a salvação nesta tua casa. Mas o que muito se deve notar, é que a Dimas prometeu-lhe o Senhor a salvação logo, e a Zaqueu não logo, senão muito depois. E porquê, se ambos eram ladrões, e ambos convertidos? Porque Dimas era ladrão pobre, e não tinha com que restituir o que roubara; Zaqueu era ladrão rico, e tinha muito com que restituir: Zachaeus, princeps erat publicanorum, et ipse dives (5), diz o evangelista. E ainda que ele o não dissera, o estado de um e outro ladrão o declarava assaz. Porquê? Porque Dimas era ladrão condenado; e se ele fora rico, claro está que não havia de chegar à forca; porém Zaqueu era ladrão tolerado, e a sua mesma riqueza era a imunidade que tinha para roubar, sem castigo, e ainda sem culpa. E como Dimas era ladrão pobre, e não tinha com que restituir, também não tinha impedimento a sua salvação, e por isso Cristo lha concedeu no mesmo momento. Pelo contrário, Zaqueu, como era ladrão rico, e tinha muito com que restituir, não lhe podia Cristo assegurar a salvação antes que restituísse, e por isso lhe dilatou a promessa. A mesma narração do Evangelho é a melhor prova desta diferença.
(…)
(1) Vem no tomo III da 1.ª edição. É um dos sermões mais característicos e ousados de Vieira. Tinha então 47 anos; era Superior dos jesuítas do Maranhão e Pará, e viera a Lisboa só para pedir providências legais a favor daquela atribulada Missão. O pregador conhecia bem o meio em que vivia, e tinha razão de sobra para reclamar limpeza de mãos.
(2) Senhor, lembrai-vos de mim, quando entrardes no vosso reino… Hoje estarás comigo no Paraíso. Luc. XXIII, 42, 43.
(3) Nome que a tradição cristã dá ao Bom Ladrão.
(4) Luc. XIX, 9.
(5) Zaqueu era um chefe dos publicanos, e rico. Luc. XIX, 2
Assim como Cristo Senhor Nosso disse a Dimas (3) hodie mecum eris in paradiso, hoje serás comigo no Paraíso, assim disse a Zaqueu hodie salus domiu huic facta est (4), hoje entrou a salvação nesta tua casa. Mas o que muito se deve notar, é que a Dimas prometeu-lhe o Senhor a salvação logo, e a Zaqueu não logo, senão muito depois. E porquê, se ambos eram ladrões, e ambos convertidos? Porque Dimas era ladrão pobre, e não tinha com que restituir o que roubara; Zaqueu era ladrão rico, e tinha muito com que restituir: Zachaeus, princeps erat publicanorum, et ipse dives (5), diz o evangelista. E ainda que ele o não dissera, o estado de um e outro ladrão o declarava assaz. Porquê? Porque Dimas era ladrão condenado; e se ele fora rico, claro está que não havia de chegar à forca; porém Zaqueu era ladrão tolerado, e a sua mesma riqueza era a imunidade que tinha para roubar, sem castigo, e ainda sem culpa. E como Dimas era ladrão pobre, e não tinha com que restituir, também não tinha impedimento a sua salvação, e por isso Cristo lha concedeu no mesmo momento. Pelo contrário, Zaqueu, como era ladrão rico, e tinha muito com que restituir, não lhe podia Cristo assegurar a salvação antes que restituísse, e por isso lhe dilatou a promessa. A mesma narração do Evangelho é a melhor prova desta diferença.
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(1) Vem no tomo III da 1.ª edição. É um dos sermões mais característicos e ousados de Vieira. Tinha então 47 anos; era Superior dos jesuítas do Maranhão e Pará, e viera a Lisboa só para pedir providências legais a favor daquela atribulada Missão. O pregador conhecia bem o meio em que vivia, e tinha razão de sobra para reclamar limpeza de mãos.
(2) Senhor, lembrai-vos de mim, quando entrardes no vosso reino… Hoje estarás comigo no Paraíso. Luc. XXIII, 42, 43.
(3) Nome que a tradição cristã dá ao Bom Ladrão.
(4) Luc. XIX, 9.
(5) Zaqueu era um chefe dos publicanos, e rico. Luc. XIX, 2
in, Sermões e Cartas do P. António Vieira, Livraria Cruz, Braga, 1958, p.9, 10
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